Processo 1003560-75.2017.8.26.0053


10035607520178260053
mapa do Brasil estilizado
  • Assuntos Processuais: Ato Lesivo ao Patrimônio Artístico, Estético, Histórico ou Turístico
  • Área: Cível
  • Tribunal: TJSP
  • UF: SP
  • Comarca: CENTRAL - FAZENDA PUBLICA ACIDENTES
  • Foro: FORO CENTRAL - FAZENDA PUBLICA ACIDENTES
  • Vara: 14A VARA DE FAZENDA PUBLICA
  • Processo principal: -
  • Arquivado: NÃO
  • Data de distribuição:
  • Extinto: SIM
  • Segredo de justiça: NÃO
  • Situação do processo no tribunal: TRAMITACAO PRIORITARIA
  • Valor da ação: 10.000,00
  • Última data de atualização deste processo no banco de dados:

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Partes
Movimentações

(17/08/2021) ATO ORDINATORIO - INTIMACAO - PORTAL - CIENCIA AO MP - Ato Ordinatório - Ciência ao Ministério Público

(17/08/2021) CERTIDAO DE REMESSA DA INTIMACAO PARA O PORTAL ELETRONICO EXPEDIDA - Certidão - Remessa da Intimação para o Portal Eletrônico

(20/04/2021) SUSPENSAO DO PRAZO - Prazo referente ao usuário foi alterado para 07/04/2021 devido à alteração da tabela de feriados Prazo referente ao usuário foi alterado para 29/04/2021 devido à alteração da tabela de feriados

(25/03/2021) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0187/2021 Data da Disponibilização: 25/03/2021 Data da Publicação: 26/03/2021 Número do Diário: Página:

(23/03/2021) REMETIDO AO DJE - Relação: 0187/2021 Teor do ato: Vistos. Ciência da baixa dos autos, requerendo as partes o quê de direito, no prazo de 15 (quinze) dias. Abra-se vista ao MPE. Int. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Denise de Cassia Zilio (OAB 90949/SP), Tony Ferreira de Carvalho Issaac Chalita (OAB 344868/SP)

(09/03/2021) CERTIDAO DE NAO CONSULTA AO TEOR DA INFORMACAO - CONTAGEM DE PRAZO DO ATO - EXPEDIDA - Certidão de Não Leitura - Contagem de Prazo do Ato

(26/02/2021) CONCLUSOS PARA DECISAO

(26/02/2021) DECISAO - Vistos. Ciência da baixa dos autos, requerendo as partes o quê de direito, no prazo de 15 (quinze) dias. Abra-se vista ao MPE. Int.

(26/02/2021) CERTIDAO DE REMESSA DA INTIMACAO PARA O PORTAL ELETRONICO EXPEDIDA - Certidão - Remessa da Intimação para o Portal Eletrônico

(28/01/2021) RECEBIDOS OS AUTOS DO TRIBUNAL DE JUSTICA - Data do julgamento: 03/08/2020 Trânsito em julgado: Tipo de julgamento: Acórdão Decisão: Rejeitada a matéria preliminar, deram provimento aos recursos nos termos do voto da Eminente Relatora. V. U. Situação do provimento: Provimento Relatora: Maria Olívia Alves

(21/10/2019) REMETIDOS OS AUTOS PARA O TRIBUNAL DE JUSTICA COLEGIO RECURSAL - PROCESSO DIGITAL

(18/10/2019) CERTIDAO DE CARTORIO EXPEDIDA - Certidão - Genérica

(18/10/2019) APENSADO AO PROCESSO - Apenso o processo 1004533-30.2017.8.26.0053 - Classe: Ação Popular - Assunto principal: Ato Lesivo ao Patrimônio Artístico, Estético, Histórico ou Turístico

(10/09/2019) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.19.70500369-6 Tipo da Petição: Manifestação do MP Data: 10/09/2019 13:57

(10/09/2019) MANIFESTACAO DO MP

(04/09/2019) ATO ORDINATORIO - INTIMACAO - PORTAL - Vista ao Ministério Público.

(18/07/2018) PROFERIDO DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE - Vistos. Fls. 366/445: ciência aos autores da ação popular, inclusive aos da que tramita em apenso, bem como ao corréu. Após, ao MPE. A seguir, conclusos em ambos. Intime-se.

(18/09/2017) ATO ORDINATORIO - INTIMACAO - PORTAL - Vista ao Ministério Público.

(15/02/2017) ATO ORDINATORIO - INTIMACAO - PORTAL - Ato Ordinatório - Genérico - Com Atos e Não Publicável

(15/02/2017) ATO ORDINATORIO - INTIMACAO - PORTAL - Vista ao Ministério Público.

(14/02/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0048/2017 Teor do ato: Vistos.Cuida-se de ação popular ajuizada por Allen Ferraudo e outros contra o Município de São Paulo e João Doria Júnior objetivando provimento jurisdicional declaratório de que é da competência exclusiva do CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo a fixação de diretrizes relacionadas à remoção ou não de pinturas e/ou desenhos que caracterizem obras de grafite, anulando-se, assim, por serem ilegais, todos os atos anteriores praticados pelo atual prefeito, além de condena-lo conjuntamente com o Município, de forma solidária, à reparação dos danos observados em virtude da referida ilegalidade, cujo montante deverá ser revertido ao Fundo de Proteção do Patrimônio Cultural e Ambiental Paulistano FUNCAP. Pedem tutela de urgência para que os réus sejam imediatamente obrigados a suspender "toda e qualquer ordem e/ou serviços de remoção de pinturas, desenhos ou inscrições caligrafadas em locais públicos, enquanto não forem dadas as diretrizes para isso pelo CONPRESP". Argumentam que o apagamento pelo município, com tinta cinza, das obras de grafite existentes em espaços públicos, sem aparente critério técnico, como uma das ações do programa "cidade linda", teria causado irreparável dano paisagístico e cultural. Diferenciam grafite de pichação, deixando claro que são desfavoráveis à degradação dos espaços públicos que seriam ocasionados pela pichação. Mencionam, neste ponto, o entendimento do promotor de justiça, Eudes Quintino de Oliveira Júnior, que salientou o reconhecimento social do grafite como arte urbana, com a sua descriminalização pela Lei Federal 12.408/2011, assim como da historiadora e mestre em artes visuais, Valéria Peixoto de Alencar em artigo publicado no portal UOL. Aludem às críticas que tal intervenção, ofensiva ao patrimônio cultural e paisagístico, vem recebendo da maioria da mídia, dos artistas, dos críticos de arte e do público em geral. Fundamentam o pedido na Lei Municipal 10.032/85, dizendo que a Secretaria Municipal da Cultura deveria ter consultado previamente o CONPRESP antes do início da referida ação, com base no artigo 2o, IV, da lei acima. Esclarecem, ademais, que a prévia manifestação do CONPRESP, por não ser composto apenas por agentes públicos, mas também por entidades representativas da sociedade (Instituto dos Arquitetos do Brasil, OAB, CREA etc.), daria mais legitimidade social às ações, aperfeiçoando o exercício da própria democracia. Informam, outrossim, que o próprio CONPRESP reconhece que "um bem cultural de natureza imaterial compreende as criações culturais de caráter dinâmico e processual, fundadas na tradição e manifestadas por indivíduos ou grupo de indivíduos como expressão de sua identidade cultural e social (resolução CONPRESP 07/16), e, ainda, que esta matéria não lhe é estranha, tanto que aprovou obras de grafite junto a imóvel na rua da Consolação, que se encontrava em processo de tombamento. O Município de São Paulo apresentou manifestação prévia, dizendo, em resumo, que o pedido de nulidade é genérico e que, ainda, não caberia o pedido cominatório em sede de ação popular. Afirma que inexiste perigo de dano para a concessão da tutela. Aduz que caberia, na verdade, não ao CONPRESP definir diretrizes sobre o grafite, e sim à CPPU Comissão de Proteção à Paisagem Urbana, como de, fato, ocorreu. Afirma que "o grafite não concerne ao patrimônio cultural para efeitos de proteção", não necessitando de prévia autorização do órgão técnico de apoio e, se necessário, do CONPRESP (artigo 21 da Lei Municipal 10.032/85), já que, como manifestação artística efêmera e transitória, não lhe serve como proteção o tombamento, "o que entraria em contradição com o próprio espírito de tal manifestação artística", conforme parecer do DPH, órgão de apoio do CONPRESP. Portanto, a disciplina do grafite se resumiria ao âmbito da paisagem urbana, o que ocorreu com a edição da Resolução SMDU.SEOC.CPPU/004/2016. Acrescenta que a parte final da resolução deixaria claro que a intervenção de grafite em bem público seria precária e sujeita à revisão a qualquer tempo por ato discricionário da autoridade pública. Enfim, o prefeito poderia remover os grafites, diante da "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". O Ministério Público Estadual (fls. 217/221), nesta esteira do raciocínio do Município de São Paulo, opinou pela denegação da tutela. É o sucinto relatório. Fundamento e decido.Primeiro, as questões processuais levantadas pelo Município não prosperam. O pedido genérico de nulidade de todos os atos de remoção de grafite deve-se à impossibilidade prática de listar todos os grafites removidos até o momento, além do mural que havia na Avenida 23 de maio. De outro lado, o entendimento restritivo de que não cabe pedido cominatório em ação popular, remédio constitucional que expressa uma das hipóteses de democracia direta previstas na Constituição de 1988, contraria o espírito do legislador constituinte, que era o de colocar nas mãos do povo a possibilidade de questionar e impedir qualquer dano ao patrimônio público levado a cabo pelo administrador. Quanto à tutela antecipada, sua concessão se impõe. Vejamos. Anoto, de antemão, que, por força do artigo 22 da Lei de Ação Popular, aplicável a norma do artigo 300 do NCPC, que cuida da concessão da tutela de urgência, à ação popular. Segundo este dispositivo, tal concessão pressupõe dois requisitos: o perigo de dano e a probabilidade do direito alegado. Ambos estão presentes na demanda em tela, à vista dos elementos trazidos na inicial e na manifestação prévia do Município. A questão posta em juízo, a meu ver, ao contrário da tese sustentada pelo município, entrelaça o simbólico mundo da arte e a estética ou paisagem urbana e, por isso mesmo, se mostra muita mais delicada do que a mera disciplina de uma intervenção qualquer em espaço urbano público, no caso. Por outros termos, envolve como, quando e de que forma, e se o Estado pode ou deve - interferir no mundo cultural e artístico, na ordenação do meio ambiente urbano, natural e construído. Comecemos, indagando se o grafite seria uma manifestação artística contemporânea, acolhida e socializada como tal por instituições e atores do campo da arte. E mais, se haveria diferença entre o grafite e a pichação, na prática, já que esta ação visa proteger apenas o grafite ou mural existente no espaço urbano público.Aqui, a despeito do dissenso de parte da sociedade, bem representada em pequena parcela da mídia que se autodenomina e se vangloria de ser conservadora, mostra-se indiscutível que o grafite é uma expressão artística urbana (street art), surgida em especial nos guetos novaiorquinos e californianos no final da década de 60 e início da década de 70, claramente ligado aos movimentos afrodescendente e hip hop, que o utilizavam como forma de manifestação ou exposição social de toda a opressão sofrida sobretudo pelos menos favorecidos, com destaque para Jean-Michel Basquiat, - que, por sinal, chegou a ser patrocinado por seu amigo Andy Warhol-, hoje reconhecido com um dos mais importantes artistas neoexpressionistas do final do século XX, e que, em breve, terá uma mostra no MASP. O grafite se espalhou pelo mundo como arte transgressora, que denunciava as mazelas da desigualdade e da exclusão sociais, chegando ao Brasil no início da década de 80, especialmente em São Paulo. Antes disso, chegou a ser incorporado pelo movimento contrário à ditadura militar e depois pelo movimento Diretas Já. Entretanto, frise-se que, ao contrário do resto do mundo, no Brasil costuma-se diferenciar grafite de pichação, tanto que o legislador em 2011 descriminalizou o grafite. Então, muito embora haja polêmica sobre isso, até porque muitos grafiteiros são declaradamente ex-pichadores, é de praxe distingui-los da seguinte forma: enquanto o grafite é uma pintura mais elaborada e complexa, multicolorida, envolvendo diversas técnicas e desenhos, que busca transmitir uma informação ou opinião, a pichação, que remanesce na legislação brasileira como ato de vandalismo, é caracterizada pelo ato de escrever palavras de protesto ou insulto, assinaturas pessoais ou de gangues em muros, fachadas de edifícios, monumentos e vias públicas, geralmente com o uso de tinta preta.O grafiteiro Rui Amaral declarou, em notícia veiculada no sítio da BBC Brasil (28 de janeiro de 2017), que o grafite também se diferencia do muralismo, já que este é encomendado e autorizado previamente pelo poder público, como era o caso dos painéis da Avenida 23 de Maio (era considerado o maior mural a céu aberto da América Latina), que foram apagados recentemente pelos réus. Portanto, o grafite, como arte urbana expressiva de uma realidade social, de uma identidade sociocultural, caracteriza-se, certamente, como bem cultural, destarte, patrimônio cultural brasileiro (artigo 216 caput e parágrafo 1o, III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais" - grifos meus), que merece ser preservado e fomentado, de alguma forma, pelo Poder Público Municipal, por força de imposição constitucional (artigo 215, caput). Tal dispositivo demarcou bem a atuação do Estado no meio cultural: garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes de cultura nacional, apoiando e incentivando a valorização e difusão das manifestações culturais. E mais, explicitou, a meu ver, o novo espectro da ação estatal nesta ordem, diante da herança histórica e cultural elitista de políticas culturais anteriores à redemocratização, qual seja, o de proteger as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes de processo civilizatório nacional. Importante: o município sustenta que a efemeridade intrínseca à arte do grafite impediria sua preservação física pelo tombamento, conforme parecer da Diretora do Departamento do Patrimônio Histórico (órgão de apoio do CONPRESP), Marina de Souza Rolim. No entanto, não se pede na presente ação a preservação dos grafites pelo tombamento, talvez pela óbvia razão de sua inadequação como meio de proteção, já que o grafite é arte marcadamente dinâmica por representar bem toda a energia, movimento e vitalidade social. A rigor, por sinal, nem a preservação é pedida. O que se requer é que o órgão técnico do município relativo à cultura (CONPRESP) se manifeste previamente sobre as diretrizes de preservação e fomento deste bem cultural. Aliás, o próprio legislador constituinte (artigo 216, parágrafo 1o) prevê que o Poder Público, cumprirá seu dever de proteção do patrimônio cultural brasileiro, por meio "de outras formas de acautelamento e preservação", além do tombamento, registros etc. O parecer da Diretora do DPH não destoa disso: "por fim, lembramos que a definição corrente de preservação engloba diversos tipos de ações, para além do tombamento. Beatriz Kühl afirma que 'a palavra preservação no Brasil possui um sentido lato que abarca variados tipos de ações, tais como inventários, registros, providências legais para a tutela, educação patrimonial e políticas públicas'". Ou seja, o caráter transitório do grafite, como arte de rua, não impede o seu reconhecimento como bem cultural, que, de fato, é, impondo, assim, alguma política cultural que o preserve ainda que por um determinado tempo, enquanto outra obra não o substitua. Aliás, como dimensionar a efemeridade desta manifestação artística, sobretudo na nossa sociedade líquida (Zygmunt Bauman) e da era digital, na qual tende a predominar a liquidez das coisas e das relações humanas? O Estado poderia fazer isso? Ou seria apenas o artista responsável pelo grafite? Certamente não é órgão competente pela ordenação da paisagem urbana, como quer o Município. Desta forma, não fosse o caráter de bem cultural do grafite, que merece preservação e fomento do Poder Público, razão teria o município de remover tais inscrições do espaço urbano público sem prévia manifestação e diretrizes do seu órgão técnico ligado à cultura, em virtude de "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". Ou seja, no caso, a nova orientação administrativa na organização do espaço urbano público consiste, basicamente, em substituir uma manifestação cultural e artística geralmente de jovens da periferia da cidade de São Paulo por tinta cinza, de gosto bastante duvidoso, e, depois, por jardim vertical. Espera-se, a sociedade paulistana (que, em pesquisa Datafolha publicada ontem, aprova, de forma esmagadora, o uso do grafite como forma de reapropriação do espaço urbano público), que esteja incluída neste novo rumo a melhoria das vias públicas onduladas e esburacadas, das muitas calçadas intransponíveis, e o emaranhado de fios e cabos das concessionárias de serviço público de energia e telefonia e das empresas particulares de tv a cabo e internet, entre outras, que despencam dos postes desta cidade. Nada obstante, pode-se dizer que tais ações, também, sob o ponto de vista da ordem urbanística (estética urbana), mostram-se contrárias, em essência, aos marcos regulatórios ético-jurídico-políticos da Constituição Federal (artigo 182 caput) e do Estatuto da Cidade, que são limites impositivos à ação política-administrativa do gestor ou administrador público. Ultrapassa-los, nulifica, juridicamente, e desqualifica, social e eticamente, sua conduta. O Estatuto da Cidade fixa, de forma clara, as diretrizes da política urbana dos Municípios para atingir os seus objetivos constitucionais (ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar dos habitantes), entre elas, merecendo destaque para o caso em questão: a gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano; e a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico. Portanto, a ação de ordenação da paisagem urbana, por imposição do Estatuto da Cidade, não pode ser decidida discricionariamente, sponte propria, pelo administrador de plantão, e, também, deve ser orientada no sentido de proteger, preservar e recuperar o patrimônio cultural e artístico. O que se tem visto é justamente o contrário: ato discricionário e precipitado, no mínimo, desprezando a opinião do colegiado técnico do município ligado à cultura, no qual se encontra representada, democraticamente, a sociedade civil, e que ultrapassa, à primeira vista, os limites impositivos fixados pelos marcos regulatórios constitucionais da ordem cultural e urbanística. Na realidade, as políticas de desenvolvimento urbano e cultural, por imposição constitucional, são definidas pelo Estado em conjunto com a sociedade, portanto, como políticas de Estado, e não de governo, como parece crer aquele que age contra suas diretrizes. Aliás, a centralidade destas políticas na agenda governamental seria o ideal, ao invés das políticas econômicas recomendadas pelo Consenso de Washington, porém, os níveis orçamentários dos entes políticos demonstram o contrário.É de se pensar se tal ação, sob forte recalque janista, não seria preconceituosa e autoritária, excludente de expressões culturais que buscam justamente a inserção social e a integração de pessoas com realidades ou experiências tão diferentes, princípios ou valores estes que, necessariamente, deveriam nortear as políticas da cultura e do desenvolvimento urbano. Também é de se ponderar se, ao invés de excluir e marginalizar jovens de baixa renda pelo aumento da proibição, não seria melhor acolhê-los em programas de desenvolvimento de suas habilidades artísticas, afastando-os do crime organizado, sem contar que a arte é tida como uma forma de sublimação do fluxo ou moção pulsional, ou seja, toda a força da pulsão é desviada, ainda que satisfação parcial, de sua finalidade primária para se colocar então a serviço de uma finalidade social, seja ela artística, intelectual ou moral (J.-D. Nasio, Lições sobre os sete conceitos cruciais da Psicanálise, Editora Zahar, p. 81). Outrossim, o item 5.3 da Resolução do CPPU citada acima, a meu ver, para ser preservado no mundo jurídico, deve ser interpretado conforme as normas constitucionais regulatórias da ordem urbanística e do Estatuto da Cidade. Assim, a revisão da autorização ali prevista, como quer o município, não pode significar a possibilidade de remoção, pura e simplesmente, do grafite ou mural, sob pena de afrontar o dever constitucional do Estado de preservar e fomentar manifestação artística popular, enquanto patrimônio cultural brasileiro. Ou melhor, significaria, no máximo, sua substituição por novo grafite do mesmo ou de outro artista.Por tudo isso, presente o requisito da probabilidade do direito; o risco de dano evidencia-se pelo próprio teor da defesa do município, que persistirá, discricionariamente, na remoção dos grafites em espaços públicos da cidade, colocando em risco o seu patrimônio cultural. Ante o exposto e o que mais consta dos autos, visando proteger o patrimônio cultural composto pelos grafites, inscrições artísticas e murais espalhados pelos espaços urbanos públicos da cidade de São Paulo, concedo a tutela antecipada para que os réus se abstenham imediatamente de removê-los sem prévia manifestação e diretrizes do CONPRESP, ou mesmo do Conselho Municipal de Política Cultural, sob pena de multa diária de quinhentos mil Reais, além de outras sanções. Citem-se, servindo a presente como mandado. Ciência do MPE.Por fim, havendo identidade de pedido e de causa de pedir remota, portanto, conexão entre a presente ação e a que tramita perante a 16a Vara da Fazenda Pública da Capital, e estando este juízo prevento, por força do artigo 59 do CPC, já que esta ação foi distribuída no dia 31 de janeiro de 2017 e aquela no dia 02 de fevereiro deste ano, solicite-se, por ofício, a remessa e redistribuição do processo nº 1003969-51.2017, para evitar decisões conflitantes. Int. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP)

(13/02/2017) DECISAO - Vistos.Cuida-se de ação popular ajuizada por Allen Ferraudo e outros contra o Município de São Paulo e João Doria Júnior objetivando provimento jurisdicional declaratório de que é da competência exclusiva do CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo a fixação de diretrizes relacionadas à remoção ou não de pinturas e/ou desenhos que caracterizem obras de grafite, anulando-se, assim, por serem ilegais, todos os atos anteriores praticados pelo atual prefeito, além de condena-lo conjuntamente com o Município, de forma solidária, à reparação dos danos observados em virtude da referida ilegalidade, cujo montante deverá ser revertido ao Fundo de Proteção do Patrimônio Cultural e Ambiental Paulistano FUNCAP. Pedem tutela de urgência para que os réus sejam imediatamente obrigados a suspender "toda e qualquer ordem e/ou serviços de remoção de pinturas, desenhos ou inscrições caligrafadas em locais públicos, enquanto não forem dadas as diretrizes para isso pelo CONPRESP". Argumentam que o apagamento pelo município, com tinta cinza, das obras de grafite existentes em espaços públicos, sem aparente critério técnico, como uma das ações do programa "cidade linda", teria causado irreparável dano paisagístico e cultural. Diferenciam grafite de pichação, deixando claro que são desfavoráveis à degradação dos espaços públicos que seriam ocasionados pela pichação. Mencionam, neste ponto, o entendimento do promotor de justiça, Eudes Quintino de Oliveira Júnior, que salientou o reconhecimento social do grafite como arte urbana, com a sua descriminalização pela Lei Federal 12.408/2011, assim como da historiadora e mestre em artes visuais, Valéria Peixoto de Alencar em artigo publicado no portal UOL. Aludem às críticas que tal intervenção, ofensiva ao patrimônio cultural e paisagístico, vem recebendo da maioria da mídia, dos artistas, dos críticos de arte e do público em geral. Fundamentam o pedido na Lei Municipal 10.032/85, dizendo que a Secretaria Municipal da Cultura deveria ter consultado previamente o CONPRESP antes do início da referida ação, com base no artigo 2o, IV, da lei acima. Esclarecem, ademais, que a prévia manifestação do CONPRESP, por não ser composto apenas por agentes públicos, mas também por entidades representativas da sociedade (Instituto dos Arquitetos do Brasil, OAB, CREA etc.), daria mais legitimidade social às ações, aperfeiçoando o exercício da própria democracia. Informam, outrossim, que o próprio CONPRESP reconhece que "um bem cultural de natureza imaterial compreende as criações culturais de caráter dinâmico e processual, fundadas na tradição e manifestadas por indivíduos ou grupo de indivíduos como expressão de sua identidade cultural e social (resolução CONPRESP 07/16), e, ainda, que esta matéria não lhe é estranha, tanto que aprovou obras de grafite junto a imóvel na rua da Consolação, que se encontrava em processo de tombamento. O Município de São Paulo apresentou manifestação prévia, dizendo, em resumo, que o pedido de nulidade é genérico e que, ainda, não caberia o pedido cominatório em sede de ação popular. Afirma que inexiste perigo de dano para a concessão da tutela. Aduz que caberia, na verdade, não ao CONPRESP definir diretrizes sobre o grafite, e sim à CPPU Comissão de Proteção à Paisagem Urbana, como de, fato, ocorreu. Afirma que "o grafite não concerne ao patrimônio cultural para efeitos de proteção", não necessitando de prévia autorização do órgão técnico de apoio e, se necessário, do CONPRESP (artigo 21 da Lei Municipal 10.032/85), já que, como manifestação artística efêmera e transitória, não lhe serve como proteção o tombamento, "o que entraria em contradição com o próprio espírito de tal manifestação artística", conforme parecer do DPH, órgão de apoio do CONPRESP. Portanto, a disciplina do grafite se resumiria ao âmbito da paisagem urbana, o que ocorreu com a edição da Resolução SMDU.SEOC.CPPU/004/2016. Acrescenta que a parte final da resolução deixaria claro que a intervenção de grafite em bem público seria precária e sujeita à revisão a qualquer tempo por ato discricionário da autoridade pública. Enfim, o prefeito poderia remover os grafites, diante da "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". O Ministério Público Estadual (fls. 217/221), nesta esteira do raciocínio do Município de São Paulo, opinou pela denegação da tutela. É o sucinto relatório. Fundamento e decido.Primeiro, as questões processuais levantadas pelo Município não prosperam. O pedido genérico de nulidade de todos os atos de remoção de grafite deve-se à impossibilidade prática de listar todos os grafites removidos até o momento, além do mural que havia na Avenida 23 de maio. De outro lado, o entendimento restritivo de que não cabe pedido cominatório em ação popular, remédio constitucional que expressa uma das hipóteses de democracia direta previstas na Constituição de 1988, contraria o espírito do legislador constituinte, que era o de colocar nas mãos do povo a possibilidade de questionar e impedir qualquer dano ao patrimônio público levado a cabo pelo administrador. Quanto à tutela antecipada, sua concessão se impõe. Vejamos. Anoto, de antemão, que, por força do artigo 22 da Lei de Ação Popular, aplicável a norma do artigo 300 do NCPC, que cuida da concessão da tutela de urgência, à ação popular. Segundo este dispositivo, tal concessão pressupõe dois requisitos: o perigo de dano e a probabilidade do direito alegado. Ambos estão presentes na demanda em tela, à vista dos elementos trazidos na inicial e na manifestação prévia do Município. A questão posta em juízo, a meu ver, ao contrário da tese sustentada pelo município, entrelaça o simbólico mundo da arte e a estética ou paisagem urbana e, por isso mesmo, se mostra muita mais delicada do que a mera disciplina de uma intervenção qualquer em espaço urbano público, no caso. Por outros termos, envolve como, quando e de que forma, e se o Estado pode ou deve - interferir no mundo cultural e artístico, na ordenação do meio ambiente urbano, natural e construído. Comecemos, indagando se o grafite seria uma manifestação artística contemporânea, acolhida e socializada como tal por instituições e atores do campo da arte. E mais, se haveria diferença entre o grafite e a pichação, na prática, já que esta ação visa proteger apenas o grafite ou mural existente no espaço urbano público.Aqui, a despeito do dissenso de parte da sociedade, bem representada em pequena parcela da mídia que se autodenomina e se vangloria de ser conservadora, mostra-se indiscutível que o grafite é uma expressão artística urbana (street art), surgida em especial nos guetos novaiorquinos e californianos no final da década de 60 e início da década de 70, claramente ligado aos movimentos afrodescendente e hip hop, que o utilizavam como forma de manifestação ou exposição social de toda a opressão sofrida sobretudo pelos menos favorecidos, com destaque para Jean-Michel Basquiat, - que, por sinal, chegou a ser patrocinado por seu amigo Andy Warhol-, hoje reconhecido com um dos mais importantes artistas neoexpressionistas do final do século XX, e que, em breve, terá uma mostra no MASP. O grafite se espalhou pelo mundo como arte transgressora, que denunciava as mazelas da desigualdade e da exclusão sociais, chegando ao Brasil no início da década de 80, especialmente em São Paulo. Antes disso, chegou a ser incorporado pelo movimento contrário à ditadura militar e depois pelo movimento Diretas Já. Entretanto, frise-se que, ao contrário do resto do mundo, no Brasil costuma-se diferenciar grafite de pichação, tanto que o legislador em 2011 descriminalizou o grafite. Então, muito embora haja polêmica sobre isso, até porque muitos grafiteiros são declaradamente ex-pichadores, é de praxe distingui-los da seguinte forma: enquanto o grafite é uma pintura mais elaborada e complexa, multicolorida, envolvendo diversas técnicas e desenhos, que busca transmitir uma informação ou opinião, a pichação, que remanesce na legislação brasileira como ato de vandalismo, é caracterizada pelo ato de escrever palavras de protesto ou insulto, assinaturas pessoais ou de gangues em muros, fachadas de edifícios, monumentos e vias públicas, geralmente com o uso de tinta preta.O grafiteiro Rui Amaral declarou, em notícia veiculada no sítio da BBC Brasil (28 de janeiro de 2017), que o grafite também se diferencia do muralismo, já que este é encomendado e autorizado previamente pelo poder público, como era o caso dos painéis da Avenida 23 de Maio (era considerado o maior mural a céu aberto da América Latina), que foram apagados recentemente pelos réus. Portanto, o grafite, como arte urbana expressiva de uma realidade social, de uma identidade sociocultural, caracteriza-se, certamente, como bem cultural, destarte, patrimônio cultural brasileiro (artigo 216 caput e parágrafo 1o, III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais" - grifos meus), que merece ser preservado e fomentado, de alguma forma, pelo Poder Público Municipal, por força de imposição constitucional (artigo 215, caput). Tal dispositivo demarcou bem a atuação do Estado no meio cultural: garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes de cultura nacional, apoiando e incentivando a valorização e difusão das manifestações culturais. E mais, explicitou, a meu ver, o novo espectro da ação estatal nesta ordem, diante da herança histórica e cultural elitista de políticas culturais anteriores à redemocratização, qual seja, o de proteger as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes de processo civilizatório nacional. Importante: o município sustenta que a efemeridade intrínseca à arte do grafite impediria sua preservação física pelo tombamento, conforme parecer da Diretora do Departamento do Patrimônio Histórico (órgão de apoio do CONPRESP), Marina de Souza Rolim. No entanto, não se pede na presente ação a preservação dos grafites pelo tombamento, talvez pela óbvia razão de sua inadequação como meio de proteção, já que o grafite é arte marcadamente dinâmica por representar bem toda a energia, movimento e vitalidade social. A rigor, por sinal, nem a preservação é pedida. O que se requer é que o órgão técnico do município relativo à cultura (CONPRESP) se manifeste previamente sobre as diretrizes de preservação e fomento deste bem cultural. Aliás, o próprio legislador constituinte (artigo 216, parágrafo 1o) prevê que o Poder Público, cumprirá seu dever de proteção do patrimônio cultural brasileiro, por meio "de outras formas de acautelamento e preservação", além do tombamento, registros etc. O parecer da Diretora do DPH não destoa disso: "por fim, lembramos que a definição corrente de preservação engloba diversos tipos de ações, para além do tombamento. Beatriz Kühl afirma que 'a palavra preservação no Brasil possui um sentido lato que abarca variados tipos de ações, tais como inventários, registros, providências legais para a tutela, educação patrimonial e políticas públicas'". Ou seja, o caráter transitório do grafite, como arte de rua, não impede o seu reconhecimento como bem cultural, que, de fato, é, impondo, assim, alguma política cultural que o preserve ainda que por um determinado tempo, enquanto outra obra não o substitua. Aliás, como dimensionar a efemeridade desta manifestação artística, sobretudo na nossa sociedade líquida (Zygmunt Bauman) e da era digital, na qual tende a predominar a liquidez das coisas e das relações humanas? O Estado poderia fazer isso? Ou seria apenas o artista responsável pelo grafite? Certamente não é órgão competente pela ordenação da paisagem urbana, como quer o Município. Desta forma, não fosse o caráter de bem cultural do grafite, que merece preservação e fomento do Poder Público, razão teria o município de remover tais inscrições do espaço urbano público sem prévia manifestação e diretrizes do seu órgão técnico ligado à cultura, em virtude de "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". Ou seja, no caso, a nova orientação administrativa na organização do espaço urbano público consiste, basicamente, em substituir uma manifestação cultural e artística geralmente de jovens da periferia da cidade de São Paulo por tinta cinza, de gosto bastante duvidoso, e, depois, por jardim vertical. Espera-se, a sociedade paulistana (que, em pesquisa Datafolha publicada ontem, aprova, de forma esmagadora, o uso do grafite como forma de reapropriação do espaço urbano público), que esteja incluída neste novo rumo a melhoria das vias públicas onduladas e esburacadas, das muitas calçadas intransponíveis, e o emaranhado de fios e cabos das concessionárias de serviço público de energia e telefonia e das empresas particulares de tv a cabo e internet, entre outras, que despencam dos postes desta cidade. Nada obstante, pode-se dizer que tais ações, também, sob o ponto de vista da ordem urbanística (estética urbana), mostram-se contrárias, em essência, aos marcos regulatórios ético-jurídico-políticos da Constituição Federal (artigo 182 caput) e do Estatuto da Cidade, que são limites impositivos à ação política-administrativa do gestor ou administrador público. Ultrapassa-los, nulifica, juridicamente, e desqualifica, social e eticamente, sua conduta. O Estatuto da Cidade fixa, de forma clara, as diretrizes da política urbana dos Municípios para atingir os seus objetivos constitucionais (ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar dos habitantes), entre elas, merecendo destaque para o caso em questão: a gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano; e a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico. Portanto, a ação de ordenação da paisagem urbana, por imposição do Estatuto da Cidade, não pode ser decidida discricionariamente, sponte propria, pelo administrador de plantão, e, também, deve ser orientada no sentido de proteger, preservar e recuperar o patrimônio cultural e artístico. O que se tem visto é justamente o contrário: ato discricionário e precipitado, no mínimo, desprezando a opinião do colegiado técnico do município ligado à cultura, no qual se encontra representada, democraticamente, a sociedade civil, e que ultrapassa, à primeira vista, os limites impositivos fixados pelos marcos regulatórios constitucionais da ordem cultural e urbanística. Na realidade, as políticas de desenvolvimento urbano e cultural, por imposição constitucional, são definidas pelo Estado em conjunto com a sociedade, portanto, como políticas de Estado, e não de governo, como parece crer aquele que age contra suas diretrizes. Aliás, a centralidade destas políticas na agenda governamental seria o ideal, ao invés das políticas econômicas recomendadas pelo Consenso de Washington, porém, os níveis orçamentários dos entes políticos demonstram o contrário.É de se pensar se tal ação, sob forte recalque janista, não seria preconceituosa e autoritária, excludente de expressões culturais que buscam justamente a inserção social e a integração de pessoas com realidades ou experiências tão diferentes, princípios ou valores estes que, necessariamente, deveriam nortear as políticas da cultura e do desenvolvimento urbano. Também é de se ponderar se, ao invés de excluir e marginalizar jovens de baixa renda pelo aumento da proibição, não seria melhor acolhê-los em programas de desenvolvimento de suas habilidades artísticas, afastando-os do crime organizado, sem contar que a arte é tida como uma forma de sublimação do fluxo ou moção pulsional, ou seja, toda a força da pulsão é desviada, ainda que satisfação parcial, de sua finalidade primária para se colocar então a serviço de uma finalidade social, seja ela artística, intelectual ou moral (J.-D. Nasio, Lições sobre os sete conceitos cruciais da Psicanálise, Editora Zahar, p. 81). Outrossim, o item 5.3 da Resolução do CPPU citada acima, a meu ver, para ser preservado no mundo jurídico, deve ser interpretado conforme as normas constitucionais regulatórias da ordem urbanística e do Estatuto da Cidade. Assim, a revisão da autorização ali prevista, como quer o município, não pode significar a possibilidade de remoção, pura e simplesmente, do grafite ou mural, sob pena de afrontar o dever constitucional do Estado de preservar e fomentar manifestação artística popular, enquanto patrimônio cultural brasileiro. Ou melhor, significaria, no máximo, sua substituição por novo grafite do mesmo ou de outro artista.Por tudo isso, presente o requisito da probabilidade do direito; o risco de dano evidencia-se pelo próprio teor da defesa do município, que persistirá, discricionariamente, na remoção dos grafites em espaços públicos da cidade, colocando em risco o seu patrimônio cultural. Ante o exposto e o que mais consta dos autos, visando proteger o patrimônio cultural composto pelos grafites, inscrições artísticas e murais espalhados pelos espaços urbanos públicos da cidade de São Paulo, concedo a tutela antecipada para que os réus se abstenham imediatamente de removê-los sem prévia manifestação e diretrizes do CONPRESP, ou mesmo do Conselho Municipal de Política Cultural, sob pena de multa diária de quinhentos mil Reais, além de outras sanções. Citem-se, servindo a presente como mandado. Ciência do MPE.Por fim, havendo identidade de pedido e de causa de pedir remota, portanto, conexão entre a presente ação e a que tramita perante a 16a Vara da Fazenda Pública da Capital, e estando este juízo prevento, por força do artigo 59 do CPC, já que esta ação foi distribuída no dia 31 de janeiro de 2017 e aquela no dia 02 de fevereiro deste ano, solicite-se, por ofício, a remessa e redistribuição do processo nº 1003969-51.2017, para evitar decisões conflitantes. Int.

(31/01/2017) ATO ORDINATORIO - INTIMACAO - PORTAL - Vista ao Ministério Público.

(04/09/2019) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0337/2019 Data da Disponibilização: 04/09/2019 Data da Publicação: 05/09/2019 Número do Diário: Página:

(04/09/2019) ATO ORDINATORIO - NAO PUBLICAVEL - Vista ao Ministério Público.

(04/09/2019) CERTIDAO DE REMESSA DA INTIMACAO PARA O PORTAL ELETRONICO EXPEDIDA - Certidão - Remessa da Intimação para o Portal Eletrônico

(03/09/2019) REMETIDO AO DJE - Relação: 0337/2019 Teor do ato: Vistos. Ao MPE. Após, ao TJSP, observando-se as ações conexas deverão subir juntas. Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), Denise de Cassia Zilio (OAB 90949/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP), Tony Ferreira de Carvalho Issaac Chalita (OAB 344868/SP)

(23/08/2019) CONCLUSOS PARA DECISAO

(23/08/2019) DECISAO - Vistos. Ao MPE. Após, ao TJSP, observando-se as ações conexas deverão subir juntas. Intime-se.

(19/08/2019) CONTRARRAZOES DE APELACAO

(19/08/2019) CONTRARRAZOES JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.19.70451858-7 Tipo da Petição: Contrarrazões de Apelação Data: 19/08/2019 16:53

(30/07/2019) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0266/2019 Data da Disponibilização: 30/07/2019 Data da Publicação: 31/07/2019 Número do Diário: Página:

(29/07/2019) REMETIDO AO DJE - Relação: 0266/2019 Teor do ato: Vistos. Às contrarrazões. Após, ao Ministério Público. Em seguida, remetam-se os autos à Instância Superior. Int. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), Denise de Cassia Zilio (OAB 90949/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP), Tony Ferreira de Carvalho Issaac Chalita (OAB 344868/SP)

(15/07/2019) CONCLUSOS PARA DECISAO

(15/07/2019) DECISAO - Vistos. Às contrarrazões. Após, ao Ministério Público. Em seguida, remetam-se os autos à Instância Superior. Int.

(10/05/2019) RAZOES DE APELACAO

(10/05/2019) APELACAO RAZOES JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.19.70242000-8 Tipo da Petição: Razões de Apelação Data: 10/05/2019 17:50

(22/04/2019) RAZOES DE APELACAO

(22/04/2019) APELACAO RAZOES JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.19.70203915-0 Tipo da Petição: Razões de Apelação Data: 22/04/2019 16:46

(17/04/2019) PETICOES DIVERSAS

(17/04/2019) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.19.70198916-3 Tipo da Petição: Petições Diversas Data: 17/04/2019 17:41

(16/04/2019) RAZOES DE APELACAO

(16/04/2019) APELACAO RAZOES JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.19.70195706-7 Tipo da Petição: Razões de Apelação Data: 16/04/2019 17:21

(27/03/2019) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0094/2019 Data da Disponibilização: 27/03/2019 Data da Publicação: 28/03/2019 Número do Diário: Página:

(26/03/2019) REMETIDO AO DJE - Relação: 0094/2019 Teor do ato: Vistos. Recebo e acolho em parte os embargos de declaração retro para dizer que, por equívoco deste juízo, não constou no relatório da sentença conjunta que também fora objeto de julgamento a ação popular nº 1003969.51.2017 ajuizada por Antonio Donato Madormo contra João Agripino da Costa Doria Júnior, que tem mesma causa de pedir e pedido das duas outras ali narradas. Acrescento que somente o Município apresentou defesa na referida ação popular. Outrossim, não há abandono desta demanda, já que houve determinação judicial para julgamento conjunto, a razão de ser da paralisação. Por fim, nesta data, lancei cópia da sentença conjunta nos autos supra. Quanto às demais alegações, a sentença não se revela omissa, contraditória ou obscura. Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), Denise de Cassia Zilio (OAB 90949/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP), Tony Ferreira de Carvalho Issaac Chalita (OAB 344868/SP)

(22/03/2019) DECISAO - Vistos. Recebo e acolho em parte os embargos de declaração retro para dizer que, por equívoco deste juízo, não constou no relatório da sentença conjunta que também fora objeto de julgamento a ação popular nº 1003969.51.2017 ajuizada por Antonio Donato Madormo contra João Agripino da Costa Doria Júnior, que tem mesma causa de pedir e pedido das duas outras ali narradas. Acrescento que somente o Município apresentou defesa na referida ação popular. Outrossim, não há abandono desta demanda, já que houve determinação judicial para julgamento conjunto, a razão de ser da paralisação. Por fim, nesta data, lancei cópia da sentença conjunta nos autos supra. Quanto às demais alegações, a sentença não se revela omissa, contraditória ou obscura. Intime-se.

(20/03/2019) CONCLUSOS PARA DECISAO

(15/03/2019) EMBARGOS DE DECLARACAO

(15/03/2019) EMBARGOS DE DECLARACAO JUNTADOS - Nº Protocolo: WFPA.19.70127162-9 Tipo da Petição: Embargos de Declaração Data: 15/03/2019 18:05

(27/02/2019) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0056/2019 Data da Disponibilização: 27/02/2019 Data da Publicação: 28/02/2019 Número do Diário: Página:

(26/02/2019) REMETIDO AO DJE - Relação: 0056/2019 Teor do ato: Vistos. Cuida-se de ação popular movida por Allen Ferraudo, Luiz Rogério da Silva, Marcelo Ferraro, Paulo Abreu Leme Filho e Renata Vieira Silva e Sousa em face do Município de São Paulo e de João Agripino Doria Costa Junior objetivando provimento jurisdicional que reconheça, primeiro, a competência do CONPRESP - Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo, para fixar "as diretrizes relacionadas à remoção ou não de pinturas e/ou desenhos que caracterizem obras de grafite" e, depois, decrete, por ilegalidade, a nulidade de todos e quaisquer atos administrativos de remoção de tais obras, praticados pelos réus, anteriores à regulação do Conselho e, por conseguinte, condene-os, solidariamente, à reparação do dano, a ser apurado em liquidação, cujo valor será revertido ao Fundo de Proteção do Patrimônio Cultural e Ambiental Paulistano - FUNCAP. Pedem liminar para suspender o serviço de remoção de pinturas, desenhos e inscrições caligrafadas em locais públicos. Em resumo, sustentam que os réus, na execução do programa de limpeza pública ou "de zeladoria" denominado "cidade linda", têm removido obras de grafite, as quais não se confundiriam com pichações, notadamente as do mural que havia na Avenida 23 de Maio, confeccionado por mais de 200 grafiteiros. Mencionam que inclusive a Lei Federal 12.408/2011 descriminalizou a grafitagem, reconhecendo-a como arte popular. Aduzem que por ser o grafite arte urbana e, por conseguinte, bem cultural de natureza imaterial (Resolução 07/2016 CONPRESP), por força da Lei Municipal 10.032/1985, caber-lhe-ia formular diretrizes sobre a sua preservação, bem como ser ouvido antes de qualquer remoção dessas pinturas. Afirmam que a ausência de diretrizes sobre tais obras de arte, formuladas pelo CONPRESP, ou mesmo sua omissão, não poderia impedir o acesso ao Judiciário para proteger o aludido patrimônio cultural. Houve manifestação prévia do Município de São Paulo (fls. 130/151). O Ministério Público do Estado de São Paulo opinou pelo indeferimento da liminar, ante a ausência de ato lesivo ao patrimônio cultural (fls. 217/221). A liminar fora concedida (fls. 222/228). Houve agravo, ao qual fora concedido efeito suspensivo, sob o argumento de que não se poderia tolher "a ação do administrador, no cuidado e preservação de áreas e prédios públicos". Menciona ainda que não se pode impor comandos genéricos à ação do administrador público. Aduz que cabe à CPPU a proteção do meio ambiente urbano contra poluição visual e, ainda, "ao CONPRESP incumbe à análise técnica de intervenções artísticas do gênero grafite em bens tombados, sob o enfoque da proteção destes últimos" (fls. 261/265). O Município apresentou defesa (fls. 267/302), alegando, em resumo, como preliminares: via inadequada, pois o que se pretende é impor ao município a implementar política pública para grafite, sendo que, sem esse antecedente, não se sustentam o pedido anulatório e condenatório; pedidos genéricos, basicamente nulidade de todos e quaisquer atos e, ainda, ausência de descrição e estimativa do dano provocado por tais atos administrativos. No mérito, afirma o seguinte: o município protegeria a arte de rua, em especial o grafite, independentemente de seu reconhecimento como patrimônio cultural; poder de polícia ambiental da CPPU também, já que a arte de rua se manifesta na paisagem urbana; a ameaça ao grafite viria sim da pichação, inexistindo direito individual ou coletivo à permanência em bens públicos de murais determinados. Fala do programa Cidade Linda, que visaria resgatar o estética urbana de São Paulo, com base no artigo 182 da CF. Menciona Lei Municipal de 16.612, de 20 de fevereiro de 2017, que institui programa de combate a pichações. Especificamente ao mural de graffiti da Avenida 23 de maio, afirma que houve apenas autorização temporária, pela Resolução nº CPPU 04/16, para utilização da infra-estrutura da via, já superada quando de sua supressão, motivada pela degradação ambiental de parte dos murais. Esclarece que aqueles não foram removidos, foram pichados, como o mural do artista Kobra. Diz que o Poder Judiciário só poderia interferir em política pública de forma excepcional, ou seja, quando a omissão dos poderes legislativo e executivo ameaçar a fundamentalidade dos direitos. Fala em ordem de prioridades, arrolando como tais educação, saúde, segurança e meio ambiente. Afirma que os direitos culturais não integram o mínimo existencial. Afirma que nem toda manifestação cultural teria valor histórico, artístico e cultural merecedora de proteção do município, isso porque somente "na forma da lei a criação reunirá os atributos que a vocacionam à tutela enquanto patrimônio cultural. No mais, a análise concreta é capaz de revelar se a máxima efetividade da cláusula constitucional que prescreve a valorização está ou não a depender da preservação dispensada pelo tombamento, o inventário e o registro". Fala que os dispositivos constitucionais do capítulo da Cultura contém normas de aplicabilidade mediata ou programáticas. A dinamicidade e transitoriedade da prática do grafite só reclamaria, quando muito, valorização, e não preservação. É que o fomento aos jovens seria mais efetivo, como política pública de valorização do grafite, o que já é realizada pelo município. Enfim, não haveria omissão municipal na política cultural relativo ao grafite. E mais que a autonomia do município para definir quais manifestações culturais reconhecerá e fomentará, bem como a forma pela qual o fará. O Judiciário não poderia definir a pauta do CONPRESP. Insiste que não cabe a este expedir diretrizes sobre o grafite, com base no Decreto-lei 25/37 e na Lei Municipal 10.032/85. Afirma que o CONPRESP só labora com o tombamento (artigo 21 da Lei Municipal 10.032/85), inadequado para resguardar o grafite. Ou seja, o CONPRESP só delibera quando o grafite afetar bens tombados ou no seu entorno. Aduz, outrossim, que o registro seria destinado à proteção do patrimônio imaterial, o que é disciplinado pela Lei Municipal 14.406/2007 e pela Resolução 07/CONPRESP/2016. O réu João Agripino da Costa Doria Júnior não apresentou defesa (certidão de fl. 316). Houve réplica (fls. 319/330). Nenhuma das partes requereu a produção de provas (fls. 333/335). O Ministério Público Estadual opina pela improcedência, dizendo que a atuação do CONPRESP está relacionada com o tombamento de bens móveis e imóveis de reconhecido caráter cultural, descabendo-lhe manifestação ou atuação em relação aos grafites (fls. 347/350). Ao agravo de instrumento fora dado integral provimento (fls. 355/363), sob o argumento de que, a despeito dos grafites merecer proteção do poder público, isso não poderia tolher o "dever de preservar os bens e espaços públicos, bem com zelar pela paisagem urbana e pelo meio ambiente, considerados os anseios de toda a população. Aliás, a pretexto de se proteger a manifestação artística não se pode obrigar a população a tolerar e incentivar a prática, como tem sido usual na cidade de São Paulo, de atos de vandalismo contra prédios espaços públicos e até mesmo propriedades privadas, quadro que sem dúvida irá se agravar se mantida a r. Decisão da forma como foi proferida. A remoção de alguns murais, já desgastados e pichados, não se evidencia, ao menos no momento, violação a patrimônio reconhecimento cultural e artístico. Ao CONPRESP incumbe à análise técnica de intervenções artísticas, como o grafite em bens tombados, sob o enfoque da proteção destes últimos. Não há previsão legal para a atuação que lhe foi determinada. Não tem cabimento, a princípio, condicionar a atuação do poder público à avaliação de tal órgão, para eventuais remoções de manifestações artísticas realizadas, mesmo em bens tombados, pois, ao que consta, qualquer tipo de intervenção nesses bens deve ser objeto de análise individual". O Município apresentou o custo ao Erário da confecção do mural de grafites apagado pelos réus que havia na Avenida 23 de Maio (fls. 366/370). Outrossim, conexa à presente demanda, há outra ação popular (processo nº 1004533.30.2017) ajuizada por Antonio Biagio Vespoli em face do Município de São Paulo, de João Agripino Doria Costa Júnior e de André Luiz Pompeia Sturm, na qual, com base no apagamento do mural de grafite que havia na Avenida 23 de maio, pede-se a condenação dos réus ao pagamento de indenização pelo dano causado ao patrimônio artístico municipal e pelo dano moral coletivo, não inferior a três vezes o valor daquele. Citado, o Município contestou (fls. 53/64). Os corréus João Doria e André Sturm não contestaram (fl. 71). Houve réplica (fls. 74/77). O Ministério Público Estadual opinou pela improcedência (fls. 86/97). É o relatório. Fundamento e decido. As ações comportam julgamento antecipado, na forma do artigo 355, I, do Código de Processo Civil. Ademais, nenhuma das partes requereu a produção de provas. Anote-se que a revelia dos corréus João Doria e André Sturm não produz os seus efeitos (345, I, CPC), à vista da contestação do Município. A presente demanda, que envolve direitos culturais, no contexto social e político do país, exige cada vez mais que se conjugue o verbo desmistificar. A pensadora francesa Simone de Beauvoir, sempre no "esforço da desmistificação" que teve seu ápice com o ensaio "O Segundo Sexo", dizia, na leitura de Sylvie Le Bon de Beauvoir: "é preciso lutar para que as respostas não precedam as questões, para que as questões mal propostas o sejam mais justamente, para que tantas misérias inúteis desapareçam e para que menos existências preciosas sejam pisoteadas" (in Brigitte Bardot e a síndrome de Lolita & outros escritos, Editoras Associadas, p. 28). À luz do teor da defesa do Município de São Paulo e da aparente incompreensão que se vê- e viu - dentro e fora dos autos, há duas questões que merecem aprofundamento antes de quaisquer respostas, e uma terceira que merece ser melhor proposta. A terceira: cultura, e não política urbana. O Município desloca, de forma inadvertida ou não, a lide posta em juízo do âmbito dos direitos culturais para o da política urbana. Os autores frise-se -, em nenhum momento, questionam o exercício do poder de polícia ambiental, dentro do programa Cidade Linda, pelo poder executivo municipal, com base no artigo 182 da Constituição Federal e na Lei Cidade Limpa (CPPU Comissão de Proteção à Paisagem Urbana). Portanto, a discussão cinge-se à impossibilidade ou não do Poder Executivo Municipal de remover graffitis existentes em equipamentos públicos (viadutos etc.), enquanto não houver normas a respeito editadas pelo CONPRESP, órgão municipal responsável pela preservação e valorização de bens culturais do município de São Paulo. Não há, nem houve, qualquer pedido, muito menos determinação judicial, impedindo ou tolhendo a Administração Municipal de remover o "pixo" da paisagem urbana da Capital. A segunda: idolatria do objeto e da imagem. Reificação. Jamais houve determinação judicial para que se protegesse este ou aquele graffiti, ou todos, e sim a manifestação ou expressão cultural, portadora de referência à identidade e à ação de um grupo social da Capital, como bem cultural imaterial. E repito: apenas que o Poder Executivo Municipal se abstivesse da remoção dos graffitis até que o CONPRESP, como lhe compete legal e constitucionalmente veremos abaixo -, definisse critérios de conservação e valorização desse bem cultural. Percebe-se, pela defesa municipal, a insistência, sem pertinência lógica, de que o graffiti é efêmero, o que impediria seu tombamento. Nunca se perquiriu a necessidade de tombamento, instrumento administrativo de conservação de bem cultural material (exemplo: prédio de arquitetura neoclássica como a Pinacoteca de São Paulo), pelo simples fato de que não se objetiva aqui a salvaguarda deste tipo bem. Historicamente, por influência eurocêntrica, há um enfoque reificado do que seja patrimônio cultural (ideias de monumentalidade e autenticidade), como se percebe claramente da lei municipal de 1985, que criou o CONPRESP, quando previu apenas a limitação administrativa do tombamento para conservação de bens culturais, hoje, ao menos na ordem jurídica, superado pelo texto constitucional (artigo 216, caput) e, em 2006, pela ratificação pelo Estado Brasileiro da Convenção para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial (UNESCO), aprovada em Paris no ano de 2003. Aliás, como se verá abaixo, o Município, após essa ratificação, promulgou a Lei 14.506/2007 para conservar e valorizar bens culturais de dimensão imaterial, com previsão do registro como instrumento de salvaguarda. Desta forma, há uma expansão do conceito de patrimônio cultural (patrimônio histórico e artístico), objeto do dever de conservação pelo Poder Público Municipal, compreendendo, livre do enfoque reificado da cultura, "antropologicamente, os bens e os processos culturais, referentes às diversas identidades coletivas". (Sílvio Pinto Ferreira Junior, in Festa de Rua, Um olhar para cultura italiana em São Paulo, Editora Annablume, p. 15) Patrimônio cultural como processo, dinâmico, e não como produto, tangível. Conservam-se assim os valores de identidade de um grupo social, a sua manifestação cultural, que, no caso, denomina-se de arte urbana. Entrelaçamento desta com outras manifestações artísticas e culturais é evidente (Hip-hop, Rap, Skate, entre outras). A arte urbana é parte da "cultura de rua". A arte urbana não é efêmera, é dinâmica, como todo ou qualquer bem ou processo cultural imaterial. Efêmero é o suporte físico de sua expressão visual. Exatamente por essa peculiaridade, impõe-se ao CONPRESP ditar normas ou diretrizes de como proteger essa expressão artística da periferia de São Paulo, levando em conta a confluência do plural e do comum: a diversidade cultural - (princípio constitucional cultural, artigo 215 (garantia a todos de participação na vida cultural) e artigo 216-A, parágrafo 1o (diversidade das expressões culturais)-, cuja manifestação artística dá-se no espaço comum. Há preocupação municipal quanto a isso: a arte urbana se manifesta em bem público de uso comum da população, sendo que parte dela, no seu entender, não gostaria de vê-la na paisagem urbana ao transitar pelas ruas de São Paulo. Além de não demonstrar o que alega haver, se isso fosse possível, de forma objetiva, não teria a menor relevância jurídica, à luz do texto constitucional (artigo 215 caput) que impõe ao Estado o dever de assegurar a todos o pleno exercício dos direitos culturais, entre eles, a liberdade cultural (sentido amplo), prevista no artigo 5o, IX, da CF. O direito de todos de participar da vida cultural. Como dito acima, o fato característico de não ser uma tela para pintura e sim a parede de um viaduto (espaço público comum) como suporte de expressão visual da arte urbana, certamente, merecerá consideração técnica do CONPRESP. O desejo individual, mesmo que compartilhado por um grupo social, contrário a essa manifestação cultural, vendo-a como poluição visual, não poderá ser sopesado pelo Estado Brasileiro, como garantidor do exercício da liberdade como valor supremo de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social. Esse modo de pensar, sutil e supostamente também fundado na liberdade, revela um certo autoritarismo, uma profunda desconsideração social à liberdade de ser e pensar do outro. Uma sociedade plural, democrática, exige, na ordem pública (no comum inclusive), que o exercício da liberdade de um cidadão não exclua ou amesquinhe o exercício da liberdade de outro. Um direito impõe um dever a outro, e vice-versa. A compreensão disso pressupõe a percepção da moderna dicotomia entre a ordem pública e a privada. Tensionadas na fronteira, cada vez mais, muito provocado pela tecnologia digital que obnubila essa cisão, com invasões recíprocas, como parece ser a gênese da alegação da defesa. Por absurdo, imagina se outra parcela da sociedade paulistana desgostar da arquitetura brutalista do MASP (patrimônio cultural material), projeto da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi. Como usuários de ônibus que trafegamos pela Avenida Paulista, em respeito à nossa liberdade de não ver tamanha fealdade, exigimos que se apague o MASP da paisagem urbana! Ou, ainda, se outra parte da sociedade decidisse, à revelia do artigo 231 da Constituição Federal, que os autóctones ou ameríndios brasileiros devessem ser integrados à organização social do homem branco europeu que os Yanomami sempre chamaram de "povo da mercadoria" (A queda do céu, palavras de um xamã yanomami, Davi Kopenawa e Bruce Albert, Cia das Letras). Em tempos lineares de censura à liberdade cultural provocada pela confusão entre o público e o privado, é necessário dizer que as vontades, os desejos, os preconceitos, os valores particulares do cidadão não devem pautar a ação política-administrativa do Estado, assim como este, camuflado daqueles, não deve interferir no processo de criação ou manifestação artística, entre outras liberdades civis. Dirigismo cultural, de qualquer espectro político, já sabemos no que dá. A estética urbana, numa democracia substantiva que nunca tivemos -, vai muito além dos graffitis, envolvendo prédios espelhados antidemocráticos (permitem ver apenas aos de dentro), devidamente autorizados pelo poder público municipal, ponte publicitária da cidade etc. No entanto, o que se busca tutelar na presente demanda é aquilo que escapa da materialidade, do visual, do tangível. Interfere visualmente na estética urbana, mas é do aspecto imaterial da cultura, do intangível. O urbanista Carlos Nelson Ferreira dos Santos já dizia nos idos de 1970: preservar não é tombar; renovar não é por tudo abaixo. O polímata Mário de Andrade, que dirigiu e criou o Departamento de Cultura (atual Secretaria Municipal de Cultura) entre 1934 e 1938, já propugnava (como se vê do anteprojeto do SPHAN atual IPHAN) pela proteção ao patrimônio cultural para além de sua dimensão material ("pedra e cal"), buscando salvaguardar a nossa memória e afirmar nossa tradição. No entanto, a temática do patrimônio imaterial, por razões burocráticas e operativas, teve que esperar a redemocratização, quando a comunidade artística organizada conseguiu introduzir no texto constitucional o conceito ampliado de patrimônio cultural, que, mesmo assim, como vimos, no âmbito do Município de São Paulo, só foi considerado em 2007, após a ratificação da Convenção da UNESCO para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial. Desde 1960, curiosamente, o poeta modernista Mário de Andrade nomeia a biblioteca municipal de São Paulo. Aliás, a sensibilidade poética, a meu ver, é a que melhor traduz a dimensão do que se pretende salvaguardar na presente demanda. Paulo Bomfim (poema Aquilo que não fomos): Ao longe, uma chuva fina/ molha aquilo que não fomos; Criolo (canção Não existe amor em SP): Não existe amor em SP/ um labirinto místico/ onde os grafites gritam. O desamor, dessa canção de musicalidade plural, é o amor que não considera ou vê o outro (ou a falta do outro), que preenche "uma falta em si mesmo, um vazio íntimo", tão combatido por Simone de Beauvoir no ensaio "o que o amor é e o que ele não é", contaminado que está pelo passado, por aquilo que não fomos. Um mimo extrauterino que é negado, na espacialidade imunitária, fantástica e surreal do filósofo alemão Peter Sloterdijk, e que poderia servir de fundamento à solidariedade, ao lado do pluralismo político, na hermenêutica sociológica da alteridade, que (re) constrói identidades e valoriza a diversidade cultural no interior da mesma cultura (Vincenzo Cicchelli, conferencista da Universidade Paris-Descartes Paris IV, in Plural e Comum, sociologia de um mundo cosmopolita, Edições SESC), como contrapontos à hegemonia provocada pela globalização econômica e cultural, algo percebido pela UNESCO para a feitura da Convenção para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial (um dos seus considerandos). Isso tudo, penso, responde à preocupação municipal de que a arte urbana seria agressiva à liberdade do cidadão que a desgoste, mantida a sua liberdade de não aprecia-la, quando transitar pelas ruas da cidade, ou de não vê-la, simplesmente permanecendo como se já encontra em muitos casos, imergido nos smartphones. A primeira: poder ilimitado da representação política. Aquém de qualquer discussão no âmbito da filosofia política (mandato imperativo ou mandato livre, ou mesmo da possibilidade de criação de mecanismos sociais efetivos de controle da democracia semidireta - Paulo Bonavides), infere-se que há no imaginário social, que permeia parte da opinião pública - se não influenciada por esta-, de que o mandatário, eleito democraticamente pela maioria votante (e geralmente bem longe de representar a maioria do povo - vide o resultado das eleições presidenciais de 2018), pode, no exercício do mandato, fazer quase tudo. Pode, deve agir, mas há limites, os quais certamente não decorrem de ordem judicial, e sim da Constituição, outra invenção do liberalismo político, e do princípio da legalidade (só é dado ao administrador no que a lei autoriza). A democracia vai além do voto. Mecanismos de legitimação da representação política foram previstos: plebiscito, referendo e iniciativa popular. Não era o bastante para o campo cultural, pois todos sabem da longa história de dependência entre os artistas e os seus patrocinadores (reis, igreja, mecenas). Na modernidade, a representação política leva para dentro do Estado, da Política o mesmo risco de que o mandatário incline-se a apoiar somente a arte de seu interesse ou que promova o sentimento nacional, excluindo de suas benesses outras manifestações culturais, quando não as perseguindo. Cuba, China e Rússia, são exemplos e a prova disso. Por isso, o legislador constituinte deu autonomia ao campo cultural para que os interesses do segmento artístico, em especial, fossem geridos para além da representação política tradicional. Uma cogestão: estado e sociedade. A participação direta da sociedade na definição das políticas públicas culturais, e também na fiscalização de sua execução pelo poder executivo, mas que lhe seja vinculante. No Brasil multicultural, a democracia, fundada no pluralismo, correria mais risco se não houvesse esse limite constitucional no âmbito dos direitos culturais. Melhor definidas as questões, às respostas, todas dadas pelo texto constitucional de 1988. O Município suscitou preliminares: sua ilegitimidade passiva; inadequação da ação; e pedido genérico. Não merecem acolhida: se intimado contestou o pedido, defendendo a legitimidade do ato administrativo, assume o polo passivo, nos termos da Lei de Ação Popular. Há, além disso, pedido de reconhecimento da competência do CONPRESP, órgão municipal responsável pela salvaguarda de bem cultural imaterial; a ação popular é também uma garantia constitucional fundamental de proteção ao patrimônio cultural (artigo 5o, LXXIII). Direitos culturais resguardados, como bem doutrina Humberto Cunha Filho (in Teoria dos Direitos Culturais, Fundamentos e Finalidades, Edições SESC, pp. 125/127), os quais têm um pertencimento simultâneo: difuso aqueles de certo segmento artístico ou histórico; coletivo ou comunitário de um grupo específico formador da sociedade; ou individual. Com a presente demanda visa-se proteger, direta e primordialmente, a dimensão coletiva da arte urbana, como expressão artística da comunidade periférica da cidade de São Paulo. E não a materialidade de cada graffiti. A determinação deste juízo de não remoção deu-se, como já mencionado acima, até que o CONPRESP, responsável pela conservação desse bem cultural, definisse diretrizes vinculantes a respeito disso dirigidas ao poder executivo municipal; não há pedido genérico, ao contrário: reconhecimento, por meio da garantia judicial da ação popular, da omissão do CONPRESP no seu poder normativo voltado à preservação de bem cultural imaterial que ameaça esse patrimônio (artigo 216, parágrafo 4o, CF) e também no de fiscalização, que permitiu a ação do poder executivo municipal, consistente na remoção de graffiti, causando dano ao mesmo patrimônio protegido, que deve ser reparado, na forma da lei. Anote-se, outrossim, que a atuação corretiva da desigualdade social pelo Estado (um dos princípios teleológicos da nossa República), por meio de qualquer tipo de fomento, evidentemente não lhe dá o direito de intervir na produção ou criação artística ou em sua expressão, cuja liberdade lhe impõe, assim como as demais cidadãos, o dever de abstenção. De toda forma, caberá ao CONPRESP definir diretrizes que preservem esse bem cultural, face à sua intervenção necessária na paisagem urbana, sem antes classificar o que pode ser considerado graffiti, em contraponto à "pixação", distinção tipicamente paulistana, e a outras manifestações, como tags e "gra-pixo" ou bomber (Alexandre Barbosa Pereira, in Um rolê pela cidade de riscos, leituras da pichação em São Paulo, Editora Edfuscar, pp. 40/41). Aliás, essa separação, que não ocorre nos EUA, cujo graffiti serviu de inspiração, revela o caráter antropofágico da nossa cultura. No âmbito do Poder Judiciário, que obviamente não pode em ação popular corrigir a omissão de outro poder mediante a prática do ato em seu lugar, com usurpação de sua competência, é suficiente, para acolhimento da ação, a mínima compreensão histórica de que há diferença entre o graffiti e a "pixação" na mentalidade ou consciência coletiva da sociedade paulistana, e também no mundo artístico. Daí a preambular e leiga distinção feita na decisão inicial para a concessão da liminar. No mérito, procedem as ações, exceto pedido de dano moral coletivo, formulada pelo autor da segunda ação popular. Vejamos. O Município de São Paulo e o corréu João Doria, então administrador municipal - participou pessoalmente -, a partir de janeiro de 2017 iniciaram ações de execução do programa de zeladoria urbana, denominado Cidade Linda, visando promover a necessária e saudável limpeza da cidade, incluindo a remoção de "pixações" e de um mural de graffiti (o maior da América Latina) existente na Avenida 23 de maio, este último, segundo a administração municipal, por estar degradado, o que gerou reações positiva e negativa da opinião pública, culminando com as ações populares em tela. Inicialmente, os autores da ação popular que gerou a dependência (prevenção deste juízo), buscam reconhecer que o graffiti, como arte urbana, seria, ao menos, patrimônio cultural imaterial de São Paulo, e que, por isso, toda e qualquer intervenção da Administração Municipal nas inúmeras manifestações dessa arte espalhadas pelo espaço público da Capital, a pretexto do exercício legítimo do poder de polícia ambiental, dependeria de prévia manifestação do CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental do Município de São Paulo. E mais que esse conselho deveria estabelecer ou fixar diretrizes a serem obedecidas na política de preservação e valorização dessa criação artística, portadora de referência à identidade e à ação da população periférica da Capital, como integrante do patrimônio cultural imaterial paulistano, no mínimo. O artigo 2o, incisos III e VI, da Lei Municipal 10.032/1985 estabelece, respectivamente, que o CONPRESP tem como atribuições, entre outras: "formular diretrizes a serem obedecidas na política de preservação e valorização dos bens culturais" e "quando necessário, opinar sobre planos, projetos e propostas de qualquer espécie referentes à preservação de bens culturais e naturais". E, também, seu artigo 8o, na redação dada pela Lei Municipal 10.236/1986: caberá ao CONPRESP, em conjunto com a Secretaria Municipal de Cultura, formular as diretrizes e as estratégicas necessárias para garantir a preservação de bens culturais e naturais. O Município sustenta que o CONPRESP, por força da Lei Municipal 10.032/85, teria atribuição apenas para fixar diretrizes à política de conservação de patrimônio histórico e cultural, cujos bens possam ser objeto de tombamento, o que não seria o caso do graffiti, manifestação artística essencialmente efêmera, transitória. O tombamento, como é sabido e ressabido, é instrumento administrativo para a proteção de bem cultural material, móvel e imóvel, o que, evidentemente, não se confunde com a manifestação cultural conhecida como arte urbana. A salvaguarda de qualquer bem cultural imaterial, por sua natureza simbólica e dinâmica - como aliás, o é todo o mundo cultural, de certa forma-, se faz adequada e necessariamente pelo inventário e (ou) pelo registro. Com isso, como a Lei Municipal 10.032/85 não menciona esses instrumentos (inventário e registro), poder-se-ia supor, como alega o Município, que o CONPRESP não teria competência para normatizar a política de preservação de bens culturais de natureza imaterial. O que não é verdade, e nem poderia, sob pena de flagrante inconstitucionalidade. Vejamos. Primeiro, a boa hermenêutica constitucional impõe ao exegeta que interprete em conformidade com a Constituição Federal a lei ordinária, que lhe é anterior, caso queira preserva-la no mundo jurídico, como evidentemente é a hipótese. A Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na nossa história, reconheceu como integrante do patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira (artigo 216 caput). E mais, estabeleceu como direito-dever do Estado e da comunidade a promoção e a proteção do patrimônio cultural brasileiro (parágrafo 1o do artigo 216). A despeito disso, somente com a ratificação, em março de 2006, pelo Estado Brasileiro da Convenção Internacional para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial (celebrada em Paris, em 17 de outubro de 2003), houve no âmbito do Município de São Paulo, a promulgação da Lei Municipal 14.406/2007, que instituiu o programa permanente de proteção e conservação do patrimônio imaterial, tendo por finalidade primordial, entre outras, "conhecer, identificar, inventariar e registrar as expressões culturais da cidade como bens de patrimônio de natureza imaterial (artigo 1o, I). Essa lei, além de reproduzir o conceito de patrimônio cultural ampliado, previsto na Constituição Federal, e prever como instrumento de proteção o registro do bem imaterial em livros, incluindo o das formas de expressão, no qual serão inscritas manifestações literárias, musicais, artísticas, cênicas e lúdicas, em procedimento idêntico ao do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI) instituído pelo Decreto Federal 3551/2000 no âmbito federal, estabeleceu como atribuição do CONPRESP receber e decidir a proposta de registro (artigo 7o) e, ainda, a sua legitimidade para provocar a instauração do respectivo processo (artigo 5o, I). Portanto, numa interpretação sistemática da legislação municipal, em consonância com a Constituição Federal, indubitável que cabe ao CONPRESP - órgão municipal colegiado responsável pela conservação do patrimônio cultural, assessorando a Secretaria Municipal de Cultura: deliberar sobre tombamento e registro de bens culturais; normatizar ou definir diretrizes a serem obedecidas pela administração municipal (poder normativo) produtor de normas vinculantes e limitadoras à ação do Poder Executivo -, na política de preservação e valorização desses mesmos bens; e fiscalizar a execução dessa política (poder de polícia), inclusive previamente à intervenção administrativa. Aqui é importante salientar que uma das grandes conquistas do setor cultural, à sua autonomia, na Constituinte de 1988 foi assegurar a participação popular na concepção e na gestão de políticas culturais (artigo 216, parágrafo 1o, CF). Para o jurista e presidente de honra do IBDCULT, Humberto Cunha Filho, desse dispositivo constitucional se infere sem qualquer dificuldade um dos princípios constitucionais culturais: o da participação popular. (Teoria dos Direitos Culturais, Fundamentos e Finalidades, Edições SESC, p. 68). No âmbito municipal, este princípio é institucionalizado pela participação de entidades civis (CREA, IAB e OAB) na composição do CONPRESP. No entanto, fica evidente, observando-se a composição original e a atual (alterada em 1986) desse conselho, a inexistência de qualquer representação de associações ou entidades ligadas à vida cultural paulistana. O CONPRESP é composto basicamente por órgãos públicos e entidades privadas que não tem relação direta com o segmento artístico. Como bem preceitua Humberto Cunha Filho, o silêncio constitucional sobre a composição, investidura e competência dos conselhos "culturais", responsáveis democra Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), Denise de Cassia Zilio (OAB 90949/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP), Tony Ferreira de Carvalho Issaac Chalita (OAB 344868/SP)

(25/02/2019) JULGADA PROCEDENTE A ACAO - Vistos. Cuida-se de ação popular movida por Allen Ferraudo, Luiz Rogério da Silva, Marcelo Ferraro, Paulo Abreu Leme Filho e Renata Vieira Silva e Sousa em face do Município de São Paulo e de João Agripino Doria Costa Junior objetivando provimento jurisdicional que reconheça, primeiro, a competência do CONPRESP - Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo, para fixar "as diretrizes relacionadas à remoção ou não de pinturas e/ou desenhos que caracterizem obras de grafite" e, depois, decrete, por ilegalidade, a nulidade de todos e quaisquer atos administrativos de remoção de tais obras, praticados pelos réus, anteriores à regulação do Conselho e, por conseguinte, condene-os, solidariamente, à reparação do dano, a ser apurado em liquidação, cujo valor será revertido ao Fundo de Proteção do Patrimônio Cultural e Ambiental Paulistano - FUNCAP. Pedem liminar para suspender o serviço de remoção de pinturas, desenhos e inscrições caligrafadas em locais públicos. Em resumo, sustentam que os réus, na execução do programa de limpeza pública ou "de zeladoria" denominado "cidade linda", têm removido obras de grafite, as quais não se confundiriam com pichações, notadamente as do mural que havia na Avenida 23 de Maio, confeccionado por mais de 200 grafiteiros. Mencionam que inclusive a Lei Federal 12.408/2011 descriminalizou a grafitagem, reconhecendo-a como arte popular. Aduzem que por ser o grafite arte urbana e, por conseguinte, bem cultural de natureza imaterial (Resolução 07/2016 CONPRESP), por força da Lei Municipal 10.032/1985, caber-lhe-ia formular diretrizes sobre a sua preservação, bem como ser ouvido antes de qualquer remoção dessas pinturas. Afirmam que a ausência de diretrizes sobre tais obras de arte, formuladas pelo CONPRESP, ou mesmo sua omissão, não poderia impedir o acesso ao Judiciário para proteger o aludido patrimônio cultural. Houve manifestação prévia do Município de São Paulo (fls. 130/151). O Ministério Público do Estado de São Paulo opinou pelo indeferimento da liminar, ante a ausência de ato lesivo ao patrimônio cultural (fls. 217/221). A liminar fora concedida (fls. 222/228). Houve agravo, ao qual fora concedido efeito suspensivo, sob o argumento de que não se poderia tolher "a ação do administrador, no cuidado e preservação de áreas e prédios públicos". Menciona ainda que não se pode impor comandos genéricos à ação do administrador público. Aduz que cabe à CPPU a proteção do meio ambiente urbano contra poluição visual e, ainda, "ao CONPRESP incumbe à análise técnica de intervenções artísticas do gênero grafite em bens tombados, sob o enfoque da proteção destes últimos" (fls. 261/265). O Município apresentou defesa (fls. 267/302), alegando, em resumo, como preliminares: via inadequada, pois o que se pretende é impor ao município a implementar política pública para grafite, sendo que, sem esse antecedente, não se sustentam o pedido anulatório e condenatório; pedidos genéricos, basicamente nulidade de todos e quaisquer atos e, ainda, ausência de descrição e estimativa do dano provocado por tais atos administrativos. No mérito, afirma o seguinte: o município protegeria a arte de rua, em especial o grafite, independentemente de seu reconhecimento como patrimônio cultural; poder de polícia ambiental da CPPU também, já que a arte de rua se manifesta na paisagem urbana; a ameaça ao grafite viria sim da pichação, inexistindo direito individual ou coletivo à permanência em bens públicos de murais determinados. Fala do programa Cidade Linda, que visaria resgatar o estética urbana de São Paulo, com base no artigo 182 da CF. Menciona Lei Municipal de 16.612, de 20 de fevereiro de 2017, que institui programa de combate a pichações. Especificamente ao mural de graffiti da Avenida 23 de maio, afirma que houve apenas autorização temporária, pela Resolução nº CPPU 04/16, para utilização da infra-estrutura da via, já superada quando de sua supressão, motivada pela degradação ambiental de parte dos murais. Esclarece que aqueles não foram removidos, foram pichados, como o mural do artista Kobra. Diz que o Poder Judiciário só poderia interferir em política pública de forma excepcional, ou seja, quando a omissão dos poderes legislativo e executivo ameaçar a fundamentalidade dos direitos. Fala em ordem de prioridades, arrolando como tais educação, saúde, segurança e meio ambiente. Afirma que os direitos culturais não integram o mínimo existencial. Afirma que nem toda manifestação cultural teria valor histórico, artístico e cultural merecedora de proteção do município, isso porque somente "na forma da lei a criação reunirá os atributos que a vocacionam à tutela enquanto patrimônio cultural. No mais, a análise concreta é capaz de revelar se a máxima efetividade da cláusula constitucional que prescreve a valorização está ou não a depender da preservação dispensada pelo tombamento, o inventário e o registro". Fala que os dispositivos constitucionais do capítulo da Cultura contém normas de aplicabilidade mediata ou programáticas. A dinamicidade e transitoriedade da prática do grafite só reclamaria, quando muito, valorização, e não preservação. É que o fomento aos jovens seria mais efetivo, como política pública de valorização do grafite, o que já é realizada pelo município. Enfim, não haveria omissão municipal na política cultural relativo ao grafite. E mais que a autonomia do município para definir quais manifestações culturais reconhecerá e fomentará, bem como a forma pela qual o fará. O Judiciário não poderia definir a pauta do CONPRESP. Insiste que não cabe a este expedir diretrizes sobre o grafite, com base no Decreto-lei 25/37 e na Lei Municipal 10.032/85. Afirma que o CONPRESP só labora com o tombamento (artigo 21 da Lei Municipal 10.032/85), inadequado para resguardar o grafite. Ou seja, o CONPRESP só delibera quando o grafite afetar bens tombados ou no seu entorno. Aduz, outrossim, que o registro seria destinado à proteção do patrimônio imaterial, o que é disciplinado pela Lei Municipal 14.406/2007 e pela Resolução 07/CONPRESP/2016. O réu João Agripino da Costa Doria Júnior não apresentou defesa (certidão de fl. 316). Houve réplica (fls. 319/330). Nenhuma das partes requereu a produção de provas (fls. 333/335). O Ministério Público Estadual opina pela improcedência, dizendo que a atuação do CONPRESP está relacionada com o tombamento de bens móveis e imóveis de reconhecido caráter cultural, descabendo-lhe manifestação ou atuação em relação aos grafites (fls. 347/350). Ao agravo de instrumento fora dado integral provimento (fls. 355/363), sob o argumento de que, a despeito dos grafites merecer proteção do poder público, isso não poderia tolher o "dever de preservar os bens e espaços públicos, bem com zelar pela paisagem urbana e pelo meio ambiente, considerados os anseios de toda a população. Aliás, a pretexto de se proteger a manifestação artística não se pode obrigar a população a tolerar e incentivar a prática, como tem sido usual na cidade de São Paulo, de atos de vandalismo contra prédios espaços públicos e até mesmo propriedades privadas, quadro que sem dúvida irá se agravar se mantida a r. Decisão da forma como foi proferida. A remoção de alguns murais, já desgastados e pichados, não se evidencia, ao menos no momento, violação a patrimônio reconhecimento cultural e artístico. Ao CONPRESP incumbe à análise técnica de intervenções artísticas, como o grafite em bens tombados, sob o enfoque da proteção destes últimos. Não há previsão legal para a atuação que lhe foi determinada. Não tem cabimento, a princípio, condicionar a atuação do poder público à avaliação de tal órgão, para eventuais remoções de manifestações artísticas realizadas, mesmo em bens tombados, pois, ao que consta, qualquer tipo de intervenção nesses bens deve ser objeto de análise individual". O Município apresentou o custo ao Erário da confecção do mural de grafites apagado pelos réus que havia na Avenida 23 de Maio (fls. 366/370). Outrossim, conexa à presente demanda, há outra ação popular (processo nº 1004533.30.2017) ajuizada por Antonio Biagio Vespoli em face do Município de São Paulo, de João Agripino Doria Costa Júnior e de André Luiz Pompeia Sturm, na qual, com base no apagamento do mural de grafite que havia na Avenida 23 de maio, pede-se a condenação dos réus ao pagamento de indenização pelo dano causado ao patrimônio artístico municipal e pelo dano moral coletivo, não inferior a três vezes o valor daquele. Citado, o Município contestou (fls. 53/64). Os corréus João Doria e André Sturm não contestaram (fl. 71). Houve réplica (fls. 74/77). O Ministério Público Estadual opinou pela improcedência (fls. 86/97). É o relatório. Fundamento e decido. As ações comportam julgamento antecipado, na forma do artigo 355, I, do Código de Processo Civil. Ademais, nenhuma das partes requereu a produção de provas. Anote-se que a revelia dos corréus João Doria e André Sturm não produz os seus efeitos (345, I, CPC), à vista da contestação do Município. A presente demanda, que envolve direitos culturais, no contexto social e político do país, exige cada vez mais que se conjugue o verbo desmistificar. A pensadora francesa Simone de Beauvoir, sempre no "esforço da desmistificação" que teve seu ápice com o ensaio "O Segundo Sexo", dizia, na leitura de Sylvie Le Bon de Beauvoir: "é preciso lutar para que as respostas não precedam as questões, para que as questões mal propostas o sejam mais justamente, para que tantas misérias inúteis desapareçam e para que menos existências preciosas sejam pisoteadas" (in Brigitte Bardot e a síndrome de Lolita & outros escritos, Editoras Associadas, p. 28). À luz do teor da defesa do Município de São Paulo e da aparente incompreensão que se vê- e viu - dentro e fora dos autos, há duas questões que merecem aprofundamento antes de quaisquer respostas, e uma terceira que merece ser melhor proposta. A terceira: cultura, e não política urbana. O Município desloca, de forma inadvertida ou não, a lide posta em juízo do âmbito dos direitos culturais para o da política urbana. Os autores frise-se -, em nenhum momento, questionam o exercício do poder de polícia ambiental, dentro do programa Cidade Linda, pelo poder executivo municipal, com base no artigo 182 da Constituição Federal e na Lei Cidade Limpa (CPPU Comissão de Proteção à Paisagem Urbana). Portanto, a discussão cinge-se à impossibilidade ou não do Poder Executivo Municipal de remover graffitis existentes em equipamentos públicos (viadutos etc.), enquanto não houver normas a respeito editadas pelo CONPRESP, órgão municipal responsável pela preservação e valorização de bens culturais do município de São Paulo. Não há, nem houve, qualquer pedido, muito menos determinação judicial, impedindo ou tolhendo a Administração Municipal de remover o "pixo" da paisagem urbana da Capital. A segunda: idolatria do objeto e da imagem. Reificação. Jamais houve determinação judicial para que se protegesse este ou aquele graffiti, ou todos, e sim a manifestação ou expressão cultural, portadora de referência à identidade e à ação de um grupo social da Capital, como bem cultural imaterial. E repito: apenas que o Poder Executivo Municipal se abstivesse da remoção dos graffitis até que o CONPRESP, como lhe compete legal e constitucionalmente veremos abaixo -, definisse critérios de conservação e valorização desse bem cultural. Percebe-se, pela defesa municipal, a insistência, sem pertinência lógica, de que o graffiti é efêmero, o que impediria seu tombamento. Nunca se perquiriu a necessidade de tombamento, instrumento administrativo de conservação de bem cultural material (exemplo: prédio de arquitetura neoclássica como a Pinacoteca de São Paulo), pelo simples fato de que não se objetiva aqui a salvaguarda deste tipo bem. Historicamente, por influência eurocêntrica, há um enfoque reificado do que seja patrimônio cultural (ideias de monumentalidade e autenticidade), como se percebe claramente da lei municipal de 1985, que criou o CONPRESP, quando previu apenas a limitação administrativa do tombamento para conservação de bens culturais, hoje, ao menos na ordem jurídica, superado pelo texto constitucional (artigo 216, caput) e, em 2006, pela ratificação pelo Estado Brasileiro da Convenção para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial (UNESCO), aprovada em Paris no ano de 2003. Aliás, como se verá abaixo, o Município, após essa ratificação, promulgou a Lei 14.506/2007 para conservar e valorizar bens culturais de dimensão imaterial, com previsão do registro como instrumento de salvaguarda. Desta forma, há uma expansão do conceito de patrimônio cultural (patrimônio histórico e artístico), objeto do dever de conservação pelo Poder Público Municipal, compreendendo, livre do enfoque reificado da cultura, "antropologicamente, os bens e os processos culturais, referentes às diversas identidades coletivas". (Sílvio Pinto Ferreira Junior, in Festa de Rua, Um olhar para cultura italiana em São Paulo, Editora Annablume, p. 15) Patrimônio cultural como processo, dinâmico, e não como produto, tangível. Conservam-se assim os valores de identidade de um grupo social, a sua manifestação cultural, que, no caso, denomina-se de arte urbana. Entrelaçamento desta com outras manifestações artísticas e culturais é evidente (Hip-hop, Rap, Skate, entre outras). A arte urbana é parte da "cultura de rua". A arte urbana não é efêmera, é dinâmica, como todo ou qualquer bem ou processo cultural imaterial. Efêmero é o suporte físico de sua expressão visual. Exatamente por essa peculiaridade, impõe-se ao CONPRESP ditar normas ou diretrizes de como proteger essa expressão artística da periferia de São Paulo, levando em conta a confluência do plural e do comum: a diversidade cultural - (princípio constitucional cultural, artigo 215 (garantia a todos de participação na vida cultural) e artigo 216-A, parágrafo 1o (diversidade das expressões culturais)-, cuja manifestação artística dá-se no espaço comum. Há preocupação municipal quanto a isso: a arte urbana se manifesta em bem público de uso comum da população, sendo que parte dela, no seu entender, não gostaria de vê-la na paisagem urbana ao transitar pelas ruas de São Paulo. Além de não demonstrar o que alega haver, se isso fosse possível, de forma objetiva, não teria a menor relevância jurídica, à luz do texto constitucional (artigo 215 caput) que impõe ao Estado o dever de assegurar a todos o pleno exercício dos direitos culturais, entre eles, a liberdade cultural (sentido amplo), prevista no artigo 5o, IX, da CF. O direito de todos de participar da vida cultural. Como dito acima, o fato característico de não ser uma tela para pintura e sim a parede de um viaduto (espaço público comum) como suporte de expressão visual da arte urbana, certamente, merecerá consideração técnica do CONPRESP. O desejo individual, mesmo que compartilhado por um grupo social, contrário a essa manifestação cultural, vendo-a como poluição visual, não poderá ser sopesado pelo Estado Brasileiro, como garantidor do exercício da liberdade como valor supremo de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social. Esse modo de pensar, sutil e supostamente também fundado na liberdade, revela um certo autoritarismo, uma profunda desconsideração social à liberdade de ser e pensar do outro. Uma sociedade plural, democrática, exige, na ordem pública (no comum inclusive), que o exercício da liberdade de um cidadão não exclua ou amesquinhe o exercício da liberdade de outro. Um direito impõe um dever a outro, e vice-versa. A compreensão disso pressupõe a percepção da moderna dicotomia entre a ordem pública e a privada. Tensionadas na fronteira, cada vez mais, muito provocado pela tecnologia digital que obnubila essa cisão, com invasões recíprocas, como parece ser a gênese da alegação da defesa. Por absurdo, imagina se outra parcela da sociedade paulistana desgostar da arquitetura brutalista do MASP (patrimônio cultural material), projeto da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi. Como usuários de ônibus que trafegamos pela Avenida Paulista, em respeito à nossa liberdade de não ver tamanha fealdade, exigimos que se apague o MASP da paisagem urbana! Ou, ainda, se outra parte da sociedade decidisse, à revelia do artigo 231 da Constituição Federal, que os autóctones ou ameríndios brasileiros devessem ser integrados à organização social do homem branco europeu que os Yanomami sempre chamaram de "povo da mercadoria" (A queda do céu, palavras de um xamã yanomami, Davi Kopenawa e Bruce Albert, Cia das Letras). Em tempos lineares de censura à liberdade cultural provocada pela confusão entre o público e o privado, é necessário dizer que as vontades, os desejos, os preconceitos, os valores particulares do cidadão não devem pautar a ação política-administrativa do Estado, assim como este, camuflado daqueles, não deve interferir no processo de criação ou manifestação artística, entre outras liberdades civis. Dirigismo cultural, de qualquer espectro político, já sabemos no que dá. A estética urbana, numa democracia substantiva que nunca tivemos -, vai muito além dos graffitis, envolvendo prédios espelhados antidemocráticos (permitem ver apenas aos de dentro), devidamente autorizados pelo poder público municipal, ponte publicitária da cidade etc. No entanto, o que se busca tutelar na presente demanda é aquilo que escapa da materialidade, do visual, do tangível. Interfere visualmente na estética urbana, mas é do aspecto imaterial da cultura, do intangível. O urbanista Carlos Nelson Ferreira dos Santos já dizia nos idos de 1970: preservar não é tombar; renovar não é por tudo abaixo. O polímata Mário de Andrade, que dirigiu e criou o Departamento de Cultura (atual Secretaria Municipal de Cultura) entre 1934 e 1938, já propugnava (como se vê do anteprojeto do SPHAN atual IPHAN) pela proteção ao patrimônio cultural para além de sua dimensão material ("pedra e cal"), buscando salvaguardar a nossa memória e afirmar nossa tradição. No entanto, a temática do patrimônio imaterial, por razões burocráticas e operativas, teve que esperar a redemocratização, quando a comunidade artística organizada conseguiu introduzir no texto constitucional o conceito ampliado de patrimônio cultural, que, mesmo assim, como vimos, no âmbito do Município de São Paulo, só foi considerado em 2007, após a ratificação da Convenção da UNESCO para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial. Desde 1960, curiosamente, o poeta modernista Mário de Andrade nomeia a biblioteca municipal de São Paulo. Aliás, a sensibilidade poética, a meu ver, é a que melhor traduz a dimensão do que se pretende salvaguardar na presente demanda. Paulo Bomfim (poema Aquilo que não fomos): Ao longe, uma chuva fina/ molha aquilo que não fomos; Criolo (canção Não existe amor em SP): Não existe amor em SP/ um labirinto místico/ onde os grafites gritam. O desamor, dessa canção de musicalidade plural, é o amor que não considera ou vê o outro (ou a falta do outro), que preenche "uma falta em si mesmo, um vazio íntimo", tão combatido por Simone de Beauvoir no ensaio "o que o amor é e o que ele não é", contaminado que está pelo passado, por aquilo que não fomos. Um mimo extrauterino que é negado, na espacialidade imunitária, fantástica e surreal do filósofo alemão Peter Sloterdijk, e que poderia servir de fundamento à solidariedade, ao lado do pluralismo político, na hermenêutica sociológica da alteridade, que (re) constrói identidades e valoriza a diversidade cultural no interior da mesma cultura (Vincenzo Cicchelli, conferencista da Universidade Paris-Descartes Paris IV, in Plural e Comum, sociologia de um mundo cosmopolita, Edições SESC), como contrapontos à hegemonia provocada pela globalização econômica e cultural, algo percebido pela UNESCO para a feitura da Convenção para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial (um dos seus considerandos). Isso tudo, penso, responde à preocupação municipal de que a arte urbana seria agressiva à liberdade do cidadão que a desgoste, mantida a sua liberdade de não aprecia-la, quando transitar pelas ruas da cidade, ou de não vê-la, simplesmente permanecendo como se já encontra em muitos casos, imergido nos smartphones. A primeira: poder ilimitado da representação política. Aquém de qualquer discussão no âmbito da filosofia política (mandato imperativo ou mandato livre, ou mesmo da possibilidade de criação de mecanismos sociais efetivos de controle da democracia semidireta - Paulo Bonavides), infere-se que há no imaginário social, que permeia parte da opinião pública - se não influenciada por esta-, de que o mandatário, eleito democraticamente pela maioria votante (e geralmente bem longe de representar a maioria do povo - vide o resultado das eleições presidenciais de 2018), pode, no exercício do mandato, fazer quase tudo. Pode, deve agir, mas há limites, os quais certamente não decorrem de ordem judicial, e sim da Constituição, outra invenção do liberalismo político, e do princípio da legalidade (só é dado ao administrador no que a lei autoriza). A democracia vai além do voto. Mecanismos de legitimação da representação política foram previstos: plebiscito, referendo e iniciativa popular. Não era o bastante para o campo cultural, pois todos sabem da longa história de dependência entre os artistas e os seus patrocinadores (reis, igreja, mecenas). Na modernidade, a representação política leva para dentro do Estado, da Política o mesmo risco de que o mandatário incline-se a apoiar somente a arte de seu interesse ou que promova o sentimento nacional, excluindo de suas benesses outras manifestações culturais, quando não as perseguindo. Cuba, China e Rússia, são exemplos e a prova disso. Por isso, o legislador constituinte deu autonomia ao campo cultural para que os interesses do segmento artístico, em especial, fossem geridos para além da representação política tradicional. Uma cogestão: estado e sociedade. A participação direta da sociedade na definição das políticas públicas culturais, e também na fiscalização de sua execução pelo poder executivo, mas que lhe seja vinculante. No Brasil multicultural, a democracia, fundada no pluralismo, correria mais risco se não houvesse esse limite constitucional no âmbito dos direitos culturais. Melhor definidas as questões, às respostas, todas dadas pelo texto constitucional de 1988. O Município suscitou preliminares: sua ilegitimidade passiva; inadequação da ação; e pedido genérico. Não merecem acolhida: se intimado contestou o pedido, defendendo a legitimidade do ato administrativo, assume o polo passivo, nos termos da Lei de Ação Popular. Há, além disso, pedido de reconhecimento da competência do CONPRESP, órgão municipal responsável pela salvaguarda de bem cultural imaterial; a ação popular é também uma garantia constitucional fundamental de proteção ao patrimônio cultural (artigo 5o, LXXIII). Direitos culturais resguardados, como bem doutrina Humberto Cunha Filho (in Teoria dos Direitos Culturais, Fundamentos e Finalidades, Edições SESC, pp. 125/127), os quais têm um pertencimento simultâneo: difuso aqueles de certo segmento artístico ou histórico; coletivo ou comunitário de um grupo específico formador da sociedade; ou individual. Com a presente demanda visa-se proteger, direta e primordialmente, a dimensão coletiva da arte urbana, como expressão artística da comunidade periférica da cidade de São Paulo. E não a materialidade de cada graffiti. A determinação deste juízo de não remoção deu-se, como já mencionado acima, até que o CONPRESP, responsável pela conservação desse bem cultural, definisse diretrizes vinculantes a respeito disso dirigidas ao poder executivo municipal; não há pedido genérico, ao contrário: reconhecimento, por meio da garantia judicial da ação popular, da omissão do CONPRESP no seu poder normativo voltado à preservação de bem cultural imaterial que ameaça esse patrimônio (artigo 216, parágrafo 4o, CF) e também no de fiscalização, que permitiu a ação do poder executivo municipal, consistente na remoção de graffiti, causando dano ao mesmo patrimônio protegido, que deve ser reparado, na forma da lei. Anote-se, outrossim, que a atuação corretiva da desigualdade social pelo Estado (um dos princípios teleológicos da nossa República), por meio de qualquer tipo de fomento, evidentemente não lhe dá o direito de intervir na produção ou criação artística ou em sua expressão, cuja liberdade lhe impõe, assim como as demais cidadãos, o dever de abstenção. De toda forma, caberá ao CONPRESP definir diretrizes que preservem esse bem cultural, face à sua intervenção necessária na paisagem urbana, sem antes classificar o que pode ser considerado graffiti, em contraponto à "pixação", distinção tipicamente paulistana, e a outras manifestações, como tags e "gra-pixo" ou bomber (Alexandre Barbosa Pereira, in Um rolê pela cidade de riscos, leituras da pichação em São Paulo, Editora Edfuscar, pp. 40/41). Aliás, essa separação, que não ocorre nos EUA, cujo graffiti serviu de inspiração, revela o caráter antropofágico da nossa cultura. No âmbito do Poder Judiciário, que obviamente não pode em ação popular corrigir a omissão de outro poder mediante a prática do ato em seu lugar, com usurpação de sua competência, é suficiente, para acolhimento da ação, a mínima compreensão histórica de que há diferença entre o graffiti e a "pixação" na mentalidade ou consciência coletiva da sociedade paulistana, e também no mundo artístico. Daí a preambular e leiga distinção feita na decisão inicial para a concessão da liminar. No mérito, procedem as ações, exceto pedido de dano moral coletivo, formulada pelo autor da segunda ação popular. Vejamos. O Município de São Paulo e o corréu João Doria, então administrador municipal - participou pessoalmente -, a partir de janeiro de 2017 iniciaram ações de execução do programa de zeladoria urbana, denominado Cidade Linda, visando promover a necessária e saudável limpeza da cidade, incluindo a remoção de "pixações" e de um mural de graffiti (o maior da América Latina) existente na Avenida 23 de maio, este último, segundo a administração municipal, por estar degradado, o que gerou reações positiva e negativa da opinião pública, culminando com as ações populares em tela. Inicialmente, os autores da ação popular que gerou a dependência (prevenção deste juízo), buscam reconhecer que o graffiti, como arte urbana, seria, ao menos, patrimônio cultural imaterial de São Paulo, e que, por isso, toda e qualquer intervenção da Administração Municipal nas inúmeras manifestações dessa arte espalhadas pelo espaço público da Capital, a pretexto do exercício legítimo do poder de polícia ambiental, dependeria de prévia manifestação do CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental do Município de São Paulo. E mais que esse conselho deveria estabelecer ou fixar diretrizes a serem obedecidas na política de preservação e valorização dessa criação artística, portadora de referência à identidade e à ação da população periférica da Capital, como integrante do patrimônio cultural imaterial paulistano, no mínimo. O artigo 2o, incisos III e VI, da Lei Municipal 10.032/1985 estabelece, respectivamente, que o CONPRESP tem como atribuições, entre outras: "formular diretrizes a serem obedecidas na política de preservação e valorização dos bens culturais" e "quando necessário, opinar sobre planos, projetos e propostas de qualquer espécie referentes à preservação de bens culturais e naturais". E, também, seu artigo 8o, na redação dada pela Lei Municipal 10.236/1986: caberá ao CONPRESP, em conjunto com a Secretaria Municipal de Cultura, formular as diretrizes e as estratégicas necessárias para garantir a preservação de bens culturais e naturais. O Município sustenta que o CONPRESP, por força da Lei Municipal 10.032/85, teria atribuição apenas para fixar diretrizes à política de conservação de patrimônio histórico e cultural, cujos bens possam ser objeto de tombamento, o que não seria o caso do graffiti, manifestação artística essencialmente efêmera, transitória. O tombamento, como é sabido e ressabido, é instrumento administrativo para a proteção de bem cultural material, móvel e imóvel, o que, evidentemente, não se confunde com a manifestação cultural conhecida como arte urbana. A salvaguarda de qualquer bem cultural imaterial, por sua natureza simbólica e dinâmica - como aliás, o é todo o mundo cultural, de certa forma-, se faz adequada e necessariamente pelo inventário e (ou) pelo registro. Com isso, como a Lei Municipal 10.032/85 não menciona esses instrumentos (inventário e registro), poder-se-ia supor, como alega o Município, que o CONPRESP não teria competência para normatizar a política de preservação de bens culturais de natureza imaterial. O que não é verdade, e nem poderia, sob pena de flagrante inconstitucionalidade. Vejamos. Primeiro, a boa hermenêutica constitucional impõe ao exegeta que interprete em conformidade com a Constituição Federal a lei ordinária, que lhe é anterior, caso queira preserva-la no mundo jurídico, como evidentemente é a hipótese. A Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na nossa história, reconheceu como integrante do patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira (artigo 216 caput). E mais, estabeleceu como direito-dever do Estado e da comunidade a promoção e a proteção do patrimônio cultural brasileiro (parágrafo 1o do artigo 216). A despeito disso, somente com a ratificação, em março de 2006, pelo Estado Brasileiro da Convenção Internacional para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial (celebrada em Paris, em 17 de outubro de 2003), houve no âmbito do Município de São Paulo, a promulgação da Lei Municipal 14.406/2007, que instituiu o programa permanente de proteção e conservação do patrimônio imaterial, tendo por finalidade primordial, entre outras, "conhecer, identificar, inventariar e registrar as expressões culturais da cidade como bens de patrimônio de natureza imaterial (artigo 1o, I). Essa lei, além de reproduzir o conceito de patrimônio cultural ampliado, previsto na Constituição Federal, e prever como instrumento de proteção o registro do bem imaterial em livros, incluindo o das formas de expressão, no qual serão inscritas manifestações literárias, musicais, artísticas, cênicas e lúdicas, em procedimento idêntico ao do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI) instituído pelo Decreto Federal 3551/2000 no âmbito federal, estabeleceu como atribuição do CONPRESP receber e decidir a proposta de registro (artigo 7o) e, ainda, a sua legitimidade para provocar a instauração do respectivo processo (artigo 5o, I). Portanto, numa interpretação sistemática da legislação municipal, em consonância com a Constituição Federal, indubitável que cabe ao CONPRESP - órgão municipal colegiado responsável pela conservação do patrimônio cultural, assessorando a Secretaria Municipal de Cultura: deliberar sobre tombamento e registro de bens culturais; normatizar ou definir diretrizes a serem obedecidas pela administração municipal (poder normativo) produtor de normas vinculantes e limitadoras à ação do Poder Executivo -, na política de preservação e valorização desses mesmos bens; e fiscalizar a execução dessa política (poder de polícia), inclusive previamente à intervenção administrativa. Aqui é importante salientar que uma das grandes conquistas do setor cultural, à sua autonomia, na Constituinte de 1988 foi assegurar a participação popular na concepção e na gestão de políticas culturais (artigo 216, parágrafo 1o, CF). Para o jurista e presidente de honra do IBDCULT, Humberto Cunha Filho, desse dispositivo constitucional se infere sem qualquer dificuldade um dos princípios constitucionais culturais: o da participação popular. (Teoria dos Direitos Culturais, Fundamentos e Finalidades, Edições SESC, p. 68). No âmbito municipal, este princípio é institucionalizado pela participação de entidades civis (CREA, IAB e OAB) na composição do CONPRESP. No entanto, fica evidente, observando-se a composição original e a atual (alterada em 1986) desse conselho, a inexistência de qualquer representação de associações ou entidades ligadas à vida cultural paulistana. O CONPRESP é composto basicamente por órgãos públicos e entidades privadas que não tem relação direta com o segmento artístico. Como bem preceitua Humberto Cunha Filho, o silêncio constitucional sobre a composição, investidura e competência dos conselhos "culturais", responsáveis democra

(07/02/2019) CONCLUSOS PARA DECISAO

(07/02/2019) CONCLUSOS PARA SENTENCA

(04/02/2019) CONCLUSOS PARA SENTENCA

(26/09/2018) PETICOES DIVERSAS

(26/09/2018) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.18.70385240-7 Tipo da Petição: Petições Diversas Data: 26/09/2018 17:25

(01/06/2018) PETICOES DIVERSAS

(16/04/2018) PETICOES DIVERSAS

(14/03/2018) PETICAO INTERMEDIARIA

(31/01/2017) DECISAO - Vistos.Ao MPE, com urgência.Intime-se.

(03/02/2017) DECISAO - Vistos.Fls.120: Aguarde-se o parecer do Ministério Público Estadual.Intime-se.

(03/02/2017) DECISAO - Vistos.Em complemento à decisão anterior, indefiro a concessão de prazo de 72 horas previsto no artigo 2º da Lei Federal 8437/92, uma vez que o STJ vem decidindo que este dispositivo não se aplica à ação popular (REsp 73.083-DF, Rel. Min. Fernando Gonçalves; e REsp 147.869-SP, Rel. Min. Adhemar Maciel).Intime-se.

(13/02/2017) DECISAO - Vistos.Cuida-se de ação popular ajuizada por Allen Ferraudo e outros contra o Município de São Paulo e João Doria Júnior objetivando provimento jurisdicional declaratório de que é da competência exclusiva do CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo a fixação de diretrizes relacionadas à remoção ou não de pinturas e/ou desenhos que caracterizem obras de grafite, anulando-se, assim, por serem ilegais, todos os atos anteriores praticados pelo atual prefeito, além de condena-lo conjuntamente com o Município, de forma solidária, à reparação dos danos observados em virtude da referida ilegalidade, cujo montante deverá ser revertido ao Fundo de Proteção do Patrimônio Cultural e Ambiental Paulistano FUNCAP. Pedem tutela de urgência para que os réus sejam imediatamente obrigados a suspender "toda e qualquer ordem e/ou serviços de remoção de pinturas, desenhos ou inscrições caligrafadas em locais públicos, enquanto não forem dadas as diretrizes para isso pelo CONPRESP". Argumentam que o apagamento pelo município, com tinta cinza, das obras de grafite existentes em espaços públicos, sem aparente critério técnico, como uma das ações do programa "cidade linda", teria causado irreparável dano paisagístico e cultural. Diferenciam grafite de pichação, deixando claro que são desfavoráveis à degradação dos espaços públicos que seriam ocasionados pela pichação. Mencionam, neste ponto, o entendimento do promotor de justiça, Eudes Quintino de Oliveira Júnior, que salientou o reconhecimento social do grafite como arte urbana, com a sua descriminalização pela Lei Federal 12.408/2011, assim como da historiadora e mestre em artes visuais, Valéria Peixoto de Alencar em artigo publicado no portal UOL. Aludem às críticas que tal intervenção, ofensiva ao patrimônio cultural e paisagístico, vem recebendo da maioria da mídia, dos artistas, dos críticos de arte e do público em geral. Fundamentam o pedido na Lei Municipal 10.032/85, dizendo que a Secretaria Municipal da Cultura deveria ter consultado previamente o CONPRESP antes do início da referida ação, com base no artigo 2o, IV, da lei acima. Esclarecem, ademais, que a prévia manifestação do CONPRESP, por não ser composto apenas por agentes públicos, mas também por entidades representativas da sociedade (Instituto dos Arquitetos do Brasil, OAB, CREA etc.), daria mais legitimidade social às ações, aperfeiçoando o exercício da própria democracia. Informam, outrossim, que o próprio CONPRESP reconhece que "um bem cultural de natureza imaterial compreende as criações culturais de caráter dinâmico e processual, fundadas na tradição e manifestadas por indivíduos ou grupo de indivíduos como expressão de sua identidade cultural e social (resolução CONPRESP 07/16), e, ainda, que esta matéria não lhe é estranha, tanto que aprovou obras de grafite junto a imóvel na rua da Consolação, que se encontrava em processo de tombamento. O Município de São Paulo apresentou manifestação prévia, dizendo, em resumo, que o pedido de nulidade é genérico e que, ainda, não caberia o pedido cominatório em sede de ação popular. Afirma que inexiste perigo de dano para a concessão da tutela. Aduz que caberia, na verdade, não ao CONPRESP definir diretrizes sobre o grafite, e sim à CPPU Comissão de Proteção à Paisagem Urbana, como de, fato, ocorreu. Afirma que "o grafite não concerne ao patrimônio cultural para efeitos de proteção", não necessitando de prévia autorização do órgão técnico de apoio e, se necessário, do CONPRESP (artigo 21 da Lei Municipal 10.032/85), já que, como manifestação artística efêmera e transitória, não lhe serve como proteção o tombamento, "o que entraria em contradição com o próprio espírito de tal manifestação artística", conforme parecer do DPH, órgão de apoio do CONPRESP. Portanto, a disciplina do grafite se resumiria ao âmbito da paisagem urbana, o que ocorreu com a edição da Resolução SMDU.SEOC.CPPU/004/2016. Acrescenta que a parte final da resolução deixaria claro que a intervenção de grafite em bem público seria precária e sujeita à revisão a qualquer tempo por ato discricionário da autoridade pública. Enfim, o prefeito poderia remover os grafites, diante da "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". O Ministério Público Estadual (fls. 217/221), nesta esteira do raciocínio do Município de São Paulo, opinou pela denegação da tutela. É o sucinto relatório. Fundamento e decido.Primeiro, as questões processuais levantadas pelo Município não prosperam. O pedido genérico de nulidade de todos os atos de remoção de grafite deve-se à impossibilidade prática de listar todos os grafites removidos até o momento, além do mural que havia na Avenida 23 de maio. De outro lado, o entendimento restritivo de que não cabe pedido cominatório em ação popular, remédio constitucional que expressa uma das hipóteses de democracia direta previstas na Constituição de 1988, contraria o espírito do legislador constituinte, que era o de colocar nas mãos do povo a possibilidade de questionar e impedir qualquer dano ao patrimônio público levado a cabo pelo administrador. Quanto à tutela antecipada, sua concessão se impõe. Vejamos. Anoto, de antemão, que, por força do artigo 22 da Lei de Ação Popular, aplicável a norma do artigo 300 do NCPC, que cuida da concessão da tutela de urgência, à ação popular. Segundo este dispositivo, tal concessão pressupõe dois requisitos: o perigo de dano e a probabilidade do direito alegado. Ambos estão presentes na demanda em tela, à vista dos elementos trazidos na inicial e na manifestação prévia do Município. A questão posta em juízo, a meu ver, ao contrário da tese sustentada pelo município, entrelaça o simbólico mundo da arte e a estética ou paisagem urbana e, por isso mesmo, se mostra muita mais delicada do que a mera disciplina de uma intervenção qualquer em espaço urbano público, no caso. Por outros termos, envolve como, quando e de que forma, e se o Estado pode ou deve - interferir no mundo cultural e artístico, na ordenação do meio ambiente urbano, natural e construído. Comecemos, indagando se o grafite seria uma manifestação artística contemporânea, acolhida e socializada como tal por instituições e atores do campo da arte. E mais, se haveria diferença entre o grafite e a pichação, na prática, já que esta ação visa proteger apenas o grafite ou mural existente no espaço urbano público.Aqui, a despeito do dissenso de parte da sociedade, bem representada em pequena parcela da mídia que se autodenomina e se vangloria de ser conservadora, mostra-se indiscutível que o grafite é uma expressão artística urbana (street art), surgida em especial nos guetos novaiorquinos e californianos no final da década de 60 e início da década de 70, claramente ligado aos movimentos afrodescendente e hip hop, que o utilizavam como forma de manifestação ou exposição social de toda a opressão sofrida sobretudo pelos menos favorecidos, com destaque para Jean-Michel Basquiat, - que, por sinal, chegou a ser patrocinado por seu amigo Andy Warhol-, hoje reconhecido com um dos mais importantes artistas neoexpressionistas do final do século XX, e que, em breve, terá uma mostra no MASP. O grafite se espalhou pelo mundo como arte transgressora, que denunciava as mazelas da desigualdade e da exclusão sociais, chegando ao Brasil no início da década de 80, especialmente em São Paulo. Antes disso, chegou a ser incorporado pelo movimento contrário à ditadura militar e depois pelo movimento Diretas Já. Entretanto, frise-se que, ao contrário do resto do mundo, no Brasil costuma-se diferenciar grafite de pichação, tanto que o legislador em 2011 descriminalizou o grafite. Então, muito embora haja polêmica sobre isso, até porque muitos grafiteiros são declaradamente ex-pichadores, é de praxe distingui-los da seguinte forma: enquanto o grafite é uma pintura mais elaborada e complexa, multicolorida, envolvendo diversas técnicas e desenhos, que busca transmitir uma informação ou opinião, a pichação, que remanesce na legislação brasileira como ato de vandalismo, é caracterizada pelo ato de escrever palavras de protesto ou insulto, assinaturas pessoais ou de gangues em muros, fachadas de edifícios, monumentos e vias públicas, geralmente com o uso de tinta preta.O grafiteiro Rui Amaral declarou, em notícia veiculada no sítio da BBC Brasil (28 de janeiro de 2017), que o grafite também se diferencia do muralismo, já que este é encomendado e autorizado previamente pelo poder público, como era o caso dos painéis da Avenida 23 de Maio (era considerado o maior mural a céu aberto da América Latina), que foram apagados recentemente pelos réus. Portanto, o grafite, como arte urbana expressiva de uma realidade social, de uma identidade sociocultural, caracteriza-se, certamente, como bem cultural, destarte, patrimônio cultural brasileiro (artigo 216 caput e parágrafo 1o, III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais" - grifos meus), que merece ser preservado e fomentado, de alguma forma, pelo Poder Público Municipal, por força de imposição constitucional (artigo 215, caput). Tal dispositivo demarcou bem a atuação do Estado no meio cultural: garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes de cultura nacional, apoiando e incentivando a valorização e difusão das manifestações culturais. E mais, explicitou, a meu ver, o novo espectro da ação estatal nesta ordem, diante da herança histórica e cultural elitista de políticas culturais anteriores à redemocratização, qual seja, o de proteger as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes de processo civilizatório nacional. Importante: o município sustenta que a efemeridade intrínseca à arte do grafite impediria sua preservação física pelo tombamento, conforme parecer da Diretora do Departamento do Patrimônio Histórico (órgão de apoio do CONPRESP), Marina de Souza Rolim. No entanto, não se pede na presente ação a preservação dos grafites pelo tombamento, talvez pela óbvia razão de sua inadequação como meio de proteção, já que o grafite é arte marcadamente dinâmica por representar bem toda a energia, movimento e vitalidade social. A rigor, por sinal, nem a preservação é pedida. O que se requer é que o órgão técnico do município relativo à cultura (CONPRESP) se manifeste previamente sobre as diretrizes de preservação e fomento deste bem cultural. Aliás, o próprio legislador constituinte (artigo 216, parágrafo 1o) prevê que o Poder Público, cumprirá seu dever de proteção do patrimônio cultural brasileiro, por meio "de outras formas de acautelamento e preservação", além do tombamento, registros etc. O parecer da Diretora do DPH não destoa disso: "por fim, lembramos que a definição corrente de preservação engloba diversos tipos de ações, para além do tombamento. Beatriz Kühl afirma que 'a palavra preservação no Brasil possui um sentido lato que abarca variados tipos de ações, tais como inventários, registros, providências legais para a tutela, educação patrimonial e políticas públicas'". Ou seja, o caráter transitório do grafite, como arte de rua, não impede o seu reconhecimento como bem cultural, que, de fato, é, impondo, assim, alguma política cultural que o preserve ainda que por um determinado tempo, enquanto outra obra não o substitua. Aliás, como dimensionar a efemeridade desta manifestação artística, sobretudo na nossa sociedade líquida (Zygmunt Bauman) e da era digital, na qual tende a predominar a liquidez das coisas e das relações humanas? O Estado poderia fazer isso? Ou seria apenas o artista responsável pelo grafite? Certamente não é órgão competente pela ordenação da paisagem urbana, como quer o Município. Desta forma, não fosse o caráter de bem cultural do grafite, que merece preservação e fomento do Poder Público, razão teria o município de remover tais inscrições do espaço urbano público sem prévia manifestação e diretrizes do seu órgão técnico ligado à cultura, em virtude de "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". Ou seja, no caso, a nova orientação administrativa na organização do espaço urbano público consiste, basicamente, em substituir uma manifestação cultural e artística geralmente de jovens da periferia da cidade de São Paulo por tinta cinza, de gosto bastante duvidoso, e, depois, por jardim vertical. Espera-se, a sociedade paulistana (que, em pesquisa Datafolha publicada ontem, aprova, de forma esmagadora, o uso do grafite como forma de reapropriação do espaço urbano público), que esteja incluída neste novo rumo a melhoria das vias públicas onduladas e esburacadas, das muitas calçadas intransponíveis, e o emaranhado de fios e cabos das concessionárias de serviço público de energia e telefonia e das empresas particulares de tv a cabo e internet, entre outras, que despencam dos postes desta cidade. Nada obstante, pode-se dizer que tais ações, também, sob o ponto de vista da ordem urbanística (estética urbana), mostram-se contrárias, em essência, aos marcos regulatórios ético-jurídico-políticos da Constituição Federal (artigo 182 caput) e do Estatuto da Cidade, que são limites impositivos à ação política-administrativa do gestor ou administrador público. Ultrapassa-los, nulifica, juridicamente, e desqualifica, social e eticamente, sua conduta. O Estatuto da Cidade fixa, de forma clara, as diretrizes da política urbana dos Municípios para atingir os seus objetivos constitucionais (ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar dos habitantes), entre elas, merecendo destaque para o caso em questão: a gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano; e a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico. Portanto, a ação de ordenação da paisagem urbana, por imposição do Estatuto da Cidade, não pode ser decididadiscricionariamente, sponte propria, pelo administrador de plantão, e, também, deve ser orientada no sentido de proteger, preservar e recuperar o patrimônio cultural e artístico. O que se tem visto é justamente o contrário: ato discricionário e precipitado, no mínimo, desprezando a opinião do colegiado técnico do município ligado à cultura, no qual se encontra representada, democraticamente, a sociedade civil, e que ultrapassa, à primeira vista, os limites impositivos fixados pelos marcos regulatórios constitucionais da ordem cultural e urbanística. Na realidade, as políticas de desenvolvimento urbano e cultural, por imposição constitucional, são definidas pelo Estado em conjunto com a sociedade, portanto, como políticas de Estado, e não de governo, como parece crer aquele que age contra suas diretrizes. Aliás, a centralidade destas políticas na agenda governamental seria o ideal, ao invés das políticas econômicas recomendadas pelo Consenso de Washington, porém, os níveis orçamentários dos entes políticos demonstram o contrário.É de se pensar se tal ação, sob forte recalque janista, não seria preconceituosa e autoritária, excludente de expressões culturais que buscam justamente a inserção social e a integração de pessoas com realidades ou experiências tão diferentes, princípios ou valores estes que, necessariamente, deveriam nortear as políticas da cultura e do desenvolvimento urbano. Também é de se ponderar se, ao invés de excluir e marginalizar jovens de baixa renda pelo aumento da proibição, não seria melhor acolhê-los em programas de desenvolvimento de suas habilidades artísticas, afastando-os do crime organizado, sem contar que a arte é tida como uma forma de sublimação do fluxo ou moção pulsional, ou seja, toda a força da pulsão é desviada, ainda que satisfação parcial, de sua finalidade primária para se colocar então a serviço de uma finalidade social, seja ela artística, intelectual ou moral (J.-D. Nasio, Lições sobre os sete conceitos cruciais da Psicanálise, Editora Zahar, p. 81). Outrossim, o item 5.3 da Resolução do CPPU citada acima, a meu ver, para ser preservado no mundo jurídico, deve ser interpretado conforme as normas constitucionais regulatórias da ordem urbanística e do Estatuto da Cidade. Assim, a revisão da autorização ali prevista, como quer o município, não pode significar a possibilidade de remoção, pura e simplesmente, do grafite ou mural, sob pena de afrontar o dever constitucional do Estado de preservar e fomentar manifestação artística popular, enquanto patrimônio cultural brasileiro. Ou melhor, significaria, no máximo, sua substituição por novo grafite do mesmo ou de outro artista.Por tudo isso, presente o requisito da probabilidade do direito; o risco de dano evidencia-se pelo próprio teor da defesa do município, que persistirá, discricionariamente, na remoção dos grafites em espaços públicos da cidade, colocando em risco o seu patrimônio cultural. Ante o exposto e o que mais consta dos autos, visando proteger o patrimônio cultural composto pelos grafites, inscrições artísticas e murais espalhados pelos espaços urbanos públicos da cidade de São Paulo, concedo a tutela antecipada para que os réus se abstenham imediatamente de removê-los sem prévia manifestação e diretrizes do CONPRESP, ou mesmo do Conselho Municipal de Política Cultural, sob pena de multa diária de quinhentos mil Reais, além de outras sanções. Citem-se, servindo a presente como mandado. Ciência do MPE.Por fim, havendo identidade de pedido e de causa de pedir remota, portanto, conexão entre a presente ação e a que tramita perante a 16a Vara da Fazenda Pública da Capital, e estando este juízo prevento, por força do artigo 59 do CPC, já que esta ação foi distribuída no dia 31 de janeiro de 2017 e aquela no dia 02 de fevereiro deste ano, solicite-se, por ofício, a remessa e redistribuição do processo nº 1003969-51.2017, para evitar decisões conflitantes. Int.

(06/03/2017) DECISAO - Vistos.Fls. 261/265: Ciente.No mais, aguarde-se a vinda da contestação.Intime-se.

(08/05/2017) DECISAO - VistosÀ réplica, nos termos dos artigos 350 e 351, ambos do NCPC, no prazo de quinze dias. Após, abra-se vistas ao Ministério Público.Intime-se.

(12/06/2017) DECISAO - Vistos.À réplica, nos termos dos artigos 350 e 351, ambos do NCPC, no prazo de quinze dias. Após, abra-se vistas ao Ministério Público.Int.

(07/07/2017) DECISAO - Vistos.A despeito da revelia do corréu, ela não produz efeito, nos termos do artigo 345, I, do NCPC.Especifiquem as provas, justificando-as, sob pena de indeferimento. Após, ao MPE, para se manifestar sobre a defesa e especificar provas.Intime-se.

(13/09/2017) DECISAO - Vistos.Por ora, ao MPE, como determinado na decisão retro, parte final.Intime-se.

(01/12/2017) DECISAO - Vistos.Por ora, diante do alegado prejuízo ao patrimônio público, constante dos autos do processo nº 1003969.51.2017, no prazo de trinta dias, deverá o Município comprovar o custo do painel que foi apagado na Avenida 23 de Maio, sob as penas da lei. Intime-se.

(14/03/2018) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.18.70078169-0 Tipo da Petição: Petição Intermediária Data: 14/03/2018 16:53

(21/03/2018) CONCLUSOS PARA DECISAO

(21/03/2018) DECISAO - Vistos.Fls. 366/445: ciência aos autores da ação popular, inclusive aos da que tramita em apenso, bem como ao corréu. Após, ao MPE.A seguir, conclusos em ambos. Intime-se.

(22/03/2018) APENSADO AO PROCESSO - Apenso o processo 1003969-51.2017.8.26.0053 - Classe: Ação Popular - Assunto principal: Ato Lesivo ao Patrimônio Artístico, Estético, Histórico ou Turístico

(13/04/2018) REMETIDO AO DJE - Relação: 0109/2018 Teor do ato: Vistos.Fls. 366/445: ciência aos autores da ação popular, inclusive aos da que tramita em apenso, bem como ao corréu. Após, ao MPE.A seguir, conclusos em ambos. Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP)

(16/04/2018) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0109/2018 Data da Disponibilização: 16/04/2018 Data da Publicação: 17/04/2018 Número do Diário: Página:

(16/04/2018) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.18.70122126-4 Tipo da Petição: Petições Diversas Data: 16/04/2018 10:34

(01/06/2018) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.18.70193660-3 Tipo da Petição: Petições Diversas Data: 01/06/2018 14:55

(18/07/2018) MERO EXPEDIENTE - Vistos. Fls. 366/445: ciência aos autores da ação popular, inclusive aos da que tramita em apenso, bem como ao corréu. Após, ao MPE. A seguir, conclusos em ambos. Intime-se.

(18/07/2018) REMETIDO AO DJE - Relação: 0261/2018 Teor do ato: Vistos. Fls. 366/445: ciência aos autores da ação popular, inclusive aos da que tramita em apenso, bem como ao corréu. Após, ao MPE. A seguir, conclusos em ambos. Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), Denise de Cassia Zilio (OAB 90949/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP), Tony Ferreira de Carvalho Issaac Chalita (OAB 344868/SP)

(19/07/2018) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0261/2018 Data da Disponibilização: 19/07/2018 Data da Publicação: 20/07/2018 Número do Diário: Página:

(31/01/2017) DISTRIBUIDO LIVREMENTE POR SORTEIO MOVIMENTACAO EXCLUSIVA DO DISTRIBUIDOR

(17/11/2017) PETICOES DIVERSAS

(05/10/2017) PETICAO INTERMEDIARIA

(24/07/2017) INDICACAO DE PROVAS

(20/07/2017) INDICACAO DE PROVAS

(23/06/2017) MANIFESTACAO SOBRE A CONTESTACAO

(13/03/2017) CONTESTACAO

(13/02/2017) MANIFESTACAO DO MP

(10/02/2017) PETICAO INTERMEDIARIA

(10/02/2017) PEDIDO DE LIMINAR ANTECIPACAO DE TUTELA

(03/02/2017) PETICOES DIVERSAS

(02/02/2017) PEDIDO DE PRAZO

(31/01/2017) CONCLUSOS PARA DECISAO

(31/01/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.Ao MPE, com urgência.Intime-se.

(31/01/2017) ATO ORDINATORIO - NAO PUBLICAVEL - Vista ao Ministério Público.

(31/01/2017) CERTIDAO DE REMESSA DA INTIMACAO PARA O PORTAL ELETRONICO EXPEDIDA - Certidão - Remessa da Intimação para o Portal Eletrônico

(02/02/2017) PEDIDO DE PRAZO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70021301-1 Tipo da Petição: Pedido de Prazo Data: 02/02/2017 15:56

(03/02/2017) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70022381-5 Tipo da Petição: Petições Diversas Data: 03/02/2017 13:15

(03/02/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.Fls.120: Aguarde-se o parecer do Ministério Público Estadual.Intime-se.

(03/02/2017) CONCLUSOS PARA DECISAO

(03/02/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.Em complemento à decisão anterior, indefiro a concessão de prazo de 72 horas previsto no artigo 2º da Lei Federal 8437/92, uma vez que o STJ vem decidindo que este dispositivo não se aplica à ação popular (REsp 73.083-DF, Rel. Min. Fernando Gonçalves; e REsp 147.869-SP, Rel. Min. Adhemar Maciel).Intime-se.

(06/02/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0034/2017 Teor do ato: Vistos.Ao MPE, com urgência.Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP)

(06/02/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0034/2017 Teor do ato: Vistos.Fls.120: Aguarde-se o parecer do Ministério Público Estadual.Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP)

(06/02/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0034/2017 Teor do ato: Vistos.Em complemento à decisão anterior, indefiro a concessão de prazo de 72 horas previsto no artigo 2º da Lei Federal 8437/92, uma vez que o STJ vem decidindo que este dispositivo não se aplica à ação popular (REsp 73.083-DF, Rel. Min. Fernando Gonçalves; e REsp 147.869-SP, Rel. Min. Adhemar Maciel).Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP)

(07/02/2017) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0034/2017 Data da Disponibilização: 07/02/2017 Data da Publicação: 08/02/2017 Número do Diário: Página:

(10/02/2017) PEDIDO DE LIMINAR TUTELA ANTECIPADA JUNTADO - Nº Protocolo: WFPA.17.70030294-4 Tipo da Petição: Pedido de Liminar/Antecipação de Tutela Data: 10/02/2017 10:12

(10/02/2017) CONCLUSOS PARA DECISAO

(10/02/2017) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70031032-7 Tipo da Petição: Petição Intermediária Data: 10/02/2017 15:55

(13/02/2017) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70031995-2 Tipo da Petição: Manifestação do MP Data: 13/02/2017 10:38

(13/02/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.Cuida-se de ação popular ajuizada por Allen Ferraudo e outros contra o Município de São Paulo e João Doria Júnior objetivando provimento jurisdicional declaratório de que é da competência exclusiva do CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo a fixação de diretrizes relacionadas à remoção ou não de pinturas e/ou desenhos que caracterizem obras de grafite, anulando-se, assim, por serem ilegais, todos os atos anteriores praticados pelo atual prefeito, além de condena-lo conjuntamente com o Município, de forma solidária, à reparação dos danos observados em virtude da referida ilegalidade, cujo montante deverá ser revertido ao Fundo de Proteção do Patrimônio Cultural e Ambiental Paulistano FUNCAP. Pedem tutela de urgência para que os réus sejam imediatamente obrigados a suspender "toda e qualquer ordem e/ou serviços de remoção de pinturas, desenhos ou inscrições caligrafadas em locais públicos, enquanto não forem dadas as diretrizes para isso pelo CONPRESP". Argumentam que o apagamento pelo município, com tinta cinza, das obras de grafite existentes em espaços públicos, sem aparente critério técnico, como uma das ações do programa "cidade linda", teria causado irreparável dano paisagístico e cultural. Diferenciam grafite de pichação, deixando claro que são desfavoráveis à degradação dos espaços públicos que seriam ocasionados pela pichação. Mencionam, neste ponto, o entendimento do promotor de justiça, Eudes Quintino de Oliveira Júnior, que salientou o reconhecimento social do grafite como arte urbana, com a sua descriminalização pela Lei Federal 12.408/2011, assim como da historiadora e mestre em artes visuais, Valéria Peixoto de Alencar em artigo publicado no portal UOL. Aludem às críticas que tal intervenção, ofensiva ao patrimônio cultural e paisagístico, vem recebendo da maioria da mídia, dos artistas, dos críticos de arte e do público em geral. Fundamentam o pedido na Lei Municipal 10.032/85, dizendo que a Secretaria Municipal da Cultura deveria ter consultado previamente o CONPRESP antes do início da referida ação, com base no artigo 2o, IV, da lei acima. Esclarecem, ademais, que a prévia manifestação do CONPRESP, por não ser composto apenas por agentes públicos, mas também por entidades representativas da sociedade (Instituto dos Arquitetos do Brasil, OAB, CREA etc.), daria mais legitimidade social às ações, aperfeiçoando o exercício da própria democracia. Informam, outrossim, que o próprio CONPRESP reconhece que "um bem cultural de natureza imaterial compreende as criações culturais de caráter dinâmico e processual, fundadas na tradição e manifestadas por indivíduos ou grupo de indivíduos como expressão de sua identidade cultural e social (resolução CONPRESP 07/16), e, ainda, que esta matéria não lhe é estranha, tanto que aprovou obras de grafite junto a imóvel na rua da Consolação, que se encontrava em processo de tombamento. O Município de São Paulo apresentou manifestação prévia, dizendo, em resumo, que o pedido de nulidade é genérico e que, ainda, não caberia o pedido cominatório em sede de ação popular. Afirma que inexiste perigo de dano para a concessão da tutela. Aduz que caberia, na verdade, não ao CONPRESP definir diretrizes sobre o grafite, e sim à CPPU Comissão de Proteção à Paisagem Urbana, como de, fato, ocorreu. Afirma que "o grafite não concerne ao patrimônio cultural para efeitos de proteção", não necessitando de prévia autorização do órgão técnico de apoio e, se necessário, do CONPRESP (artigo 21 da Lei Municipal 10.032/85), já que, como manifestação artística efêmera e transitória, não lhe serve como proteção o tombamento, "o que entraria em contradição com o próprio espírito de tal manifestação artística", conforme parecer do DPH, órgão de apoio do CONPRESP. Portanto, a disciplina do grafite se resumiria ao âmbito da paisagem urbana, o que ocorreu com a edição da Resolução SMDU.SEOC.CPPU/004/2016. Acrescenta que a parte final da resolução deixaria claro que a intervenção de grafite em bem público seria precária e sujeita à revisão a qualquer tempo por ato discricionário da autoridade pública. Enfim, o prefeito poderia remover os grafites, diante da "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". O Ministério Público Estadual (fls. 217/221), nesta esteira do raciocínio do Município de São Paulo, opinou pela denegação da tutela. É o sucinto relatório. Fundamento e decido.Primeiro, as questões processuais levantadas pelo Município não prosperam. O pedido genérico de nulidade de todos os atos de remoção de grafite deve-se à impossibilidade prática de listar todos os grafites removidos até o momento, além do mural que havia na Avenida 23 de maio. De outro lado, o entendimento restritivo de que não cabe pedido cominatório em ação popular, remédio constitucional que expressa uma das hipóteses de democracia direta previstas na Constituição de 1988, contraria o espírito do legislador constituinte, que era o de colocar nas mãos do povo a possibilidade de questionar e impedir qualquer dano ao patrimônio público levado a cabo pelo administrador. Quanto à tutela antecipada, sua concessão se impõe. Vejamos. Anoto, de antemão, que, por força do artigo 22 da Lei de Ação Popular, aplicável a norma do artigo 300 do NCPC, que cuida da concessão da tutela de urgência, à ação popular. Segundo este dispositivo, tal concessão pressupõe dois requisitos: o perigo de dano e a probabilidade do direito alegado. Ambos estão presentes na demanda em tela, à vista dos elementos trazidos na inicial e na manifestação prévia do Município. A questão posta em juízo, a meu ver, ao contrário da tese sustentada pelo município, entrelaça o simbólico mundo da arte e a estética ou paisagem urbana e, por isso mesmo, se mostra muita mais delicada do que a mera disciplina de uma intervenção qualquer em espaço urbano público, no caso. Por outros termos, envolve como, quando e de que forma, e se o Estado pode ou deve - interferir no mundo cultural e artístico, na ordenação do meio ambiente urbano, natural e construído. Comecemos, indagando se o grafite seria uma manifestação artística contemporânea, acolhida e socializada como tal por instituições e atores do campo da arte. E mais, se haveria diferença entre o grafite e a pichação, na prática, já que esta ação visa proteger apenas o grafite ou mural existente no espaço urbano público.Aqui, a despeito do dissenso de parte da sociedade, bem representada em pequena parcela da mídia que se autodenomina e se vangloria de ser conservadora, mostra-se indiscutível que o grafite é uma expressão artística urbana (street art), surgida em especial nos guetos novaiorquinos e californianos no final da década de 60 e início da década de 70, claramente ligado aos movimentos afrodescendente e hip hop, que o utilizavam como forma de manifestação ou exposição social de toda a opressão sofrida sobretudo pelos menos favorecidos, com destaque para Jean-Michel Basquiat, - que, por sinal, chegou a ser patrocinado por seu amigo Andy Warhol-, hoje reconhecido com um dos mais importantes artistas neoexpressionistas do final do século XX, e que, em breve, terá uma mostra no MASP. O grafite se espalhou pelo mundo como arte transgressora, que denunciava as mazelas da desigualdade e da exclusão sociais, chegando ao Brasil no início da década de 80, especialmente em São Paulo. Antes disso, chegou a ser incorporado pelo movimento contrário à ditadura militar e depois pelo movimento Diretas Já. Entretanto, frise-se que, ao contrário do resto do mundo, no Brasil costuma-se diferenciar grafite de pichação, tanto que o legislador em 2011 descriminalizou o grafite. Então, muito embora haja polêmica sobre isso, até porque muitos grafiteiros são declaradamente ex-pichadores, é de praxe distingui-los da seguinte forma: enquanto o grafite é uma pintura mais elaborada e complexa, multicolorida, envolvendo diversas técnicas e desenhos, que busca transmitir uma informação ou opinião, a pichação, que remanesce na legislação brasileira como ato de vandalismo, é caracterizada pelo ato de escrever palavras de protesto ou insulto, assinaturas pessoais ou de gangues em muros, fachadas de edifícios, monumentos e vias públicas, geralmente com o uso de tinta preta.O grafiteiro Rui Amaral declarou, em notícia veiculada no sítio da BBC Brasil (28 de janeiro de 2017), que o grafite também se diferencia do muralismo, já que este é encomendado e autorizado previamente pelo poder público, como era o caso dos painéis da Avenida 23 de Maio (era considerado o maior mural a céu aberto da América Latina), que foram apagados recentemente pelos réus. Portanto, o grafite, como arte urbana expressiva de uma realidade social, de uma identidade sociocultural, caracteriza-se, certamente, como bem cultural, destarte, patrimônio cultural brasileiro (artigo 216 caput e parágrafo 1o, III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais" - grifos meus), que merece ser preservado e fomentado, de alguma forma, pelo Poder Público Municipal, por força de imposição constitucional (artigo 215, caput). Tal dispositivo demarcou bem a atuação do Estado no meio cultural: garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes de cultura nacional, apoiando e incentivando a valorização e difusão das manifestações culturais. E mais, explicitou, a meu ver, o novo espectro da ação estatal nesta ordem, diante da herança histórica e cultural elitista de políticas culturais anteriores à redemocratização, qual seja, o de proteger as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes de processo civilizatório nacional. Importante: o município sustenta que a efemeridade intrínseca à arte do grafite impediria sua preservação física pelo tombamento, conforme parecer da Diretora do Departamento do Patrimônio Histórico (órgão de apoio do CONPRESP), Marina de Souza Rolim. No entanto, não se pede na presente ação a preservação dos grafites pelo tombamento, talvez pela óbvia razão de sua inadequação como meio de proteção, já que o grafite é arte marcadamente dinâmica por representar bem toda a energia, movimento e vitalidade social. A rigor, por sinal, nem a preservação é pedida. O que se requer é que o órgão técnico do município relativo à cultura (CONPRESP) se manifeste previamente sobre as diretrizes de preservação e fomento deste bem cultural. Aliás, o próprio legislador constituinte (artigo 216, parágrafo 1o) prevê que o Poder Público, cumprirá seu dever de proteção do patrimônio cultural brasileiro, por meio "de outras formas de acautelamento e preservação", além do tombamento, registros etc. O parecer da Diretora do DPH não destoa disso: "por fim, lembramos que a definição corrente de preservação engloba diversos tipos de ações, para além do tombamento. Beatriz Kühl afirma que 'a palavra preservação no Brasil possui um sentido lato que abarca variados tipos de ações, tais como inventários, registros, providências legais para a tutela, educação patrimonial e políticas públicas'". Ou seja, o caráter transitório do grafite, como arte de rua, não impede o seu reconhecimento como bem cultural, que, de fato, é, impondo, assim, alguma política cultural que o preserve ainda que por um determinado tempo, enquanto outra obra não o substitua. Aliás, como dimensionar a efemeridade desta manifestação artística, sobretudo na nossa sociedade líquida (Zygmunt Bauman) e da era digital, na qual tende a predominar a liquidez das coisas e das relações humanas? O Estado poderia fazer isso? Ou seria apenas o artista responsável pelo grafite? Certamente não é órgão competente pela ordenação da paisagem urbana, como quer o Município. Desta forma, não fosse o caráter de bem cultural do grafite, que merece preservação e fomento do Poder Público, razão teria o município de remover tais inscrições do espaço urbano público sem prévia manifestação e diretrizes do seu órgão técnico ligado à cultura, em virtude de "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". Ou seja, no caso, a nova orientação administrativa na organização do espaço urbano público consiste, basicamente, em substituir uma manifestação cultural e artística geralmente de jovens da periferia da cidade de São Paulo por tinta cinza, de gosto bastante duvidoso, e, depois, por jardim vertical. Espera-se, a sociedade paulistana (que, em pesquisa Datafolha publicada ontem, aprova, de forma esmagadora, o uso do grafite como forma de reapropriação do espaço urbano público), que esteja incluída neste novo rumo a melhoria das vias públicas onduladas e esburacadas, das muitas calçadas intransponíveis, e o emaranhado de fios e cabos das concessionárias de serviço público de energia e telefonia e das empresas particulares de tv a cabo e internet, entre outras, que despencam dos postes desta cidade. Nada obstante, pode-se dizer que tais ações, também, sob o ponto de vista da ordem urbanística (estética urbana), mostram-se contrárias, em essência, aos marcos regulatórios ético-jurídico-políticos da Constituição Federal (artigo 182 caput) e do Estatuto da Cidade, que são limites impositivos à ação política-administrativa do gestor ou administrador público. Ultrapassa-los, nulifica, juridicamente, e desqualifica, social e eticamente, sua conduta. O Estatuto da Cidade fixa, de forma clara, as diretrizes da política urbana dos Municípios para atingir os seus objetivos constitucionais (ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar dos habitantes), entre elas, merecendo destaque para o caso em questão: a gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano; e a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico. Portanto, a ação de ordenação da paisagem urbana, por imposição do Estatuto da Cidade, não pode ser decididadiscricionariamente, sponte propria, pelo administrador de plantão, e, também, deve ser orientada no sentido de proteger, preservar e recuperar o patrimônio cultural e artístico. O que se tem visto é justamente o contrário: ato discricionário e precipitado, no mínimo, desprezando a opinião do colegiado técnico do município ligado à cultura, no qual se encontra representada, democraticamente, a sociedade civil, e que ultrapassa, à primeira vista, os limites impositivos fixados pelos marcos regulatórios constitucionais da ordem cultural e urbanística. Na realidade, as políticas de desenvolvimento urbano e cultural, por imposição constitucional, são definidas pelo Estado em conjunto com a sociedade, portanto, como políticas de Estado, e não de governo, como parece crer aquele que age contra suas diretrizes. Aliás, a centralidade destas políticas na agenda governamental seria o ideal, ao invés das políticas econômicas recomendadas pelo Consenso de Washington, porém, os níveis orçamentários dos entes políticos demonstram o contrário.É de se pensar se tal ação, sob forte recalque janista, não seria preconceituosa e autoritária, excludente de expressões culturais que buscam justamente a inserção social e a integração de pessoas com realidades ou experiências tão diferentes, princípios ou valores estes que, necessariamente, deveriam nortear as políticas da cultura e do desenvolvimento urbano. Também é de se ponderar se, ao invés de excluir e marginalizar jovens de baixa renda pelo aumento da proibição, não seria melhor acolhê-los em programas de desenvolvimento de suas habilidades artísticas, afastando-os do crime organizado, sem contar que a arte é tida como uma forma de sublimação do fluxo ou moção pulsional, ou seja, toda a força da pulsão é desviada, ainda que satisfação parcial, de sua finalidade primária para se colocar então a serviço de uma finalidade social, seja ela artística, intelectual ou moral (J.-D. Nasio, Lições sobre os sete conceitos cruciais da Psicanálise, Editora Zahar, p. 81). Outrossim, o item 5.3 da Resolução do CPPU citada acima, a meu ver, para ser preservado no mundo jurídico, deve ser interpretado conforme as normas constitucionais regulatórias da ordem urbanística e do Estatuto da Cidade. Assim, a revisão da autorização ali prevista, como quer o município, não pode significar a possibilidade de remoção, pura e simplesmente, do grafite ou mural, sob pena de afrontar o dever constitucional do Estado de preservar e fomentar manifestação artística popular, enquanto patrimônio cultural brasileiro. Ou melhor, significaria, no máximo, sua substituição por novo grafite do mesmo ou de outro artista.Por tudo isso, presente o requisito da probabilidade do direito; o risco de dano evidencia-se pelo próprio teor da defesa do município, que persistirá, discricionariamente, na remoção dos grafites em espaços públicos da cidade, colocando em risco o seu patrimônio cultural. Ante o exposto e o que mais consta dos autos, visando proteger o patrimônio cultural composto pelos grafites, inscrições artísticas e murais espalhados pelos espaços urbanos públicos da cidade de São Paulo, concedo a tutela antecipada para que os réus se abstenham imediatamente de removê-los sem prévia manifestação e diretrizes do CONPRESP, ou mesmo do Conselho Municipal de Política Cultural, sob pena de multa diária de quinhentos mil Reais, além de outras sanções. Citem-se, servindo a presente como mandado. Ciência do MPE.Por fim, havendo identidade de pedido e de causa de pedir remota, portanto, conexão entre a presente ação e a que tramita perante a 16a Vara da Fazenda Pública da Capital, e estando este juízo prevento, por força do artigo 59 do CPC, já que esta ação foi distribuída no dia 31 de janeiro de 2017 e aquela no dia 02 de fevereiro deste ano, solicite-se, por ofício, a remessa e redistribuição do processo nº 1003969-51.2017, para evitar decisões conflitantes. Int.

(13/02/2017) OFICIO EXPEDIDO - Ofício - Genérico

(14/02/2017) CERTIDAO DE CARTORIO EXPEDIDA - Certidão - Genérica

(14/02/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0048/2017 Teor do ato: Vistos.Cuida-se de ação popular ajuizada por Allen Ferraudo e outros contra o Município de São Paulo e João Doria Júnior objetivando provimento jurisdicional declaratório de que é da competência exclusiva do CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo a fixação de diretrizes relacionadas à remoção ou não de pinturas e/ou desenhos que caracterizem obras de grafite, anulando-se, assim, por serem ilegais, todos os atos anteriores praticados pelo atual prefeito, além de condena-lo conjuntamente com o Município, de forma solidária, à reparação dos danos observados em virtude da referida ilegalidade, cujo montante deverá ser revertido ao Fundo de Proteção do Patrimônio Cultural e Ambiental Paulistano FUNCAP. Pedem tutela de urgência para que os réus sejam imediatamente obrigados a suspender "toda e qualquer ordem e/ou serviços de remoção de pinturas, desenhos ou inscrições caligrafadas em locais públicos, enquanto não forem dadas as diretrizes para isso pelo CONPRESP". Argumentam que o apagamento pelo município, com tinta cinza, das obras de grafite existentes em espaços públicos, sem aparente critério técnico, como uma das ações do programa "cidade linda", teria causado irreparável dano paisagístico e cultural. Diferenciam grafite de pichação, deixando claro que são desfavoráveis à degradação dos espaços públicos que seriam ocasionados pela pichação. Mencionam, neste ponto, o entendimento do promotor de justiça, Eudes Quintino de Oliveira Júnior, que salientou o reconhecimento social do grafite como arte urbana, com a sua descriminalização pela Lei Federal 12.408/2011, assim como da historiadora e mestre em artes visuais, Valéria Peixoto de Alencar em artigo publicado no portal UOL. Aludem às críticas que tal intervenção, ofensiva ao patrimônio cultural e paisagístico, vem recebendo da maioria da mídia, dos artistas, dos críticos de arte e do público em geral. Fundamentam o pedido na Lei Municipal 10.032/85, dizendo que a Secretaria Municipal da Cultura deveria ter consultado previamente o CONPRESP antes do início da referida ação, com base no artigo 2o, IV, da lei acima. Esclarecem, ademais, que a prévia manifestação do CONPRESP, por não ser composto apenas por agentes públicos, mas também por entidades representativas da sociedade (Instituto dos Arquitetos do Brasil, OAB, CREA etc.), daria mais legitimidade social às ações, aperfeiçoando o exercício da própria democracia. Informam, outrossim, que o próprio CONPRESP reconhece que "um bem cultural de natureza imaterial compreende as criações culturais de caráter dinâmico e processual, fundadas na tradição e manifestadas por indivíduos ou grupo de indivíduos como expressão de sua identidade cultural e social (resolução CONPRESP 07/16), e, ainda, que esta matéria não lhe é estranha, tanto que aprovou obras de grafite junto a imóvel na rua da Consolação, que se encontrava em processo de tombamento. O Município de São Paulo apresentou manifestação prévia, dizendo, em resumo, que o pedido de nulidade é genérico e que, ainda, não caberia o pedido cominatório em sede de ação popular. Afirma que inexiste perigo de dano para a concessão da tutela. Aduz que caberia, na verdade, não ao CONPRESP definir diretrizes sobre o grafite, e sim à CPPU Comissão de Proteção à Paisagem Urbana, como de, fato, ocorreu. Afirma que "o grafite não concerne ao patrimônio cultural para efeitos de proteção", não necessitando de prévia autorização do órgão técnico de apoio e, se necessário, do CONPRESP (artigo 21 da Lei Municipal 10.032/85), já que, como manifestação artística efêmera e transitória, não lhe serve como proteção o tombamento, "o que entraria em contradição com o próprio espírito de tal manifestação artística", conforme parecer do DPH, órgão de apoio do CONPRESP. Portanto, a disciplina do grafite se resumiria ao âmbito da paisagem urbana, o que ocorreu com a edição da Resolução SMDU.SEOC.CPPU/004/2016. Acrescenta que a parte final da resolução deixaria claro que a intervenção de grafite em bem público seria precária e sujeita à revisão a qualquer tempo por ato discricionário da autoridade pública. Enfim, o prefeito poderia remover os grafites, diante da "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". O Ministério Público Estadual (fls. 217/221), nesta esteira do raciocínio do Município de São Paulo, opinou pela denegação da tutela. É o sucinto relatório. Fundamento e decido.Primeiro, as questões processuais levantadas pelo Município não prosperam. O pedido genérico de nulidade de todos os atos de remoção de grafite deve-se à impossibilidade prática de listar todos os grafites removidos até o momento, além do mural que havia na Avenida 23 de maio. De outro lado, o entendimento restritivo de que não cabe pedido cominatório em ação popular, remédio constitucional que expressa uma das hipóteses de democracia direta previstas na Constituição de 1988, contraria o espírito do legislador constituinte, que era o de colocar nas mãos do povo a possibilidade de questionar e impedir qualquer dano ao patrimônio público levado a cabo pelo administrador. Quanto à tutela antecipada, sua concessão se impõe. Vejamos. Anoto, de antemão, que, por força do artigo 22 da Lei de Ação Popular, aplicável a norma do artigo 300 do NCPC, que cuida da concessão da tutela de urgência, à ação popular. Segundo este dispositivo, tal concessão pressupõe dois requisitos: o perigo de dano e a probabilidade do direito alegado. Ambos estão presentes na demanda em tela, à vista dos elementos trazidos na inicial e na manifestação prévia do Município. A questão posta em juízo, a meu ver, ao contrário da tese sustentada pelo município, entrelaça o simbólico mundo da arte e a estética ou paisagem urbana e, por isso mesmo, se mostra muita mais delicada do que a mera disciplina de uma intervenção qualquer em espaço urbano público, no caso. Por outros termos, envolve como, quando e de que forma, e se o Estado pode ou deve - interferir no mundo cultural e artístico, na ordenação do meio ambiente urbano, natural e construído. Comecemos, indagando se o grafite seria uma manifestação artística contemporânea, acolhida e socializada como tal por instituições e atores do campo da arte. E mais, se haveria diferença entre o grafite e a pichação, na prática, já que esta ação visa proteger apenas o grafite ou mural existente no espaço urbano público.Aqui, a despeito do dissenso de parte da sociedade, bem representada em pequena parcela da mídia que se autodenomina e se vangloria de ser conservadora, mostra-se indiscutível que o grafite é uma expressão artística urbana (street art), surgida em especial nos guetos novaiorquinos e californianos no final da década de 60 e início da década de 70, claramente ligado aos movimentos afrodescendente e hip hop, que o utilizavam como forma de manifestação ou exposição social de toda a opressão sofrida sobretudo pelos menos favorecidos, com destaque para Jean-Michel Basquiat, - que, por sinal, chegou a ser patrocinado por seu amigo Andy Warhol-, hoje reconhecido com um dos mais importantes artistas neoexpressionistas do final do século XX, e que, em breve, terá uma mostra no MASP. O grafite se espalhou pelo mundo como arte transgressora, que denunciava as mazelas da desigualdade e da exclusão sociais, chegando ao Brasil no início da década de 80, especialmente em São Paulo. Antes disso, chegou a ser incorporado pelo movimento contrário à ditadura militar e depois pelo movimento Diretas Já. Entretanto, frise-se que, ao contrário do resto do mundo, no Brasil costuma-se diferenciar grafite de pichação, tanto que o legislador em 2011 descriminalizou o grafite. Então, muito embora haja polêmica sobre isso, até porque muitos grafiteiros são declaradamente ex-pichadores, é de praxe distingui-los da seguinte forma: enquanto o grafite é uma pintura mais elaborada e complexa, multicolorida, envolvendo diversas técnicas e desenhos, que busca transmitir uma informação ou opinião, a pichação, que remanesce na legislação brasileira como ato de vandalismo, é caracterizada pelo ato de escrever palavras de protesto ou insulto, assinaturas pessoais ou de gangues em muros, fachadas de edifícios, monumentos e vias públicas, geralmente com o uso de tinta preta.O grafiteiro Rui Amaral declarou, em notícia veiculada no sítio da BBC Brasil (28 de janeiro de 2017), que o grafite também se diferencia do muralismo, já que este é encomendado e autorizado previamente pelo poder público, como era o caso dos painéis da Avenida 23 de Maio (era considerado o maior mural a céu aberto da América Latina), que foram apagados recentemente pelos réus. Portanto, o grafite, como arte urbana expressiva de uma realidade social, de uma identidade sociocultural, caracteriza-se, certamente, como bem cultural, destarte, patrimônio cultural brasileiro (artigo 216 caput e parágrafo 1o, III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais" - grifos meus), que merece ser preservado e fomentado, de alguma forma, pelo Poder Público Municipal, por força de imposição constitucional (artigo 215, caput). Tal dispositivo demarcou bem a atuação do Estado no meio cultural: garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes de cultura nacional, apoiando e incentivando a valorização e difusão das manifestações culturais. E mais, explicitou, a meu ver, o novo espectro da ação estatal nesta ordem, diante da herança histórica e cultural elitista de políticas culturais anteriores à redemocratização, qual seja, o de proteger as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes de processo civilizatório nacional. Importante: o município sustenta que a efemeridade intrínseca à arte do grafite impediria sua preservação física pelo tombamento, conforme parecer da Diretora do Departamento do Patrimônio Histórico (órgão de apoio do CONPRESP), Marina de Souza Rolim. No entanto, não se pede na presente ação a preservação dos grafites pelo tombamento, talvez pela óbvia razão de sua inadequação como meio de proteção, já que o grafite é arte marcadamente dinâmica por representar bem toda a energia, movimento e vitalidade social. A rigor, por sinal, nem a preservação é pedida. O que se requer é que o órgão técnico do município relativo à cultura (CONPRESP) se manifeste previamente sobre as diretrizes de preservação e fomento deste bem cultural. Aliás, o próprio legislador constituinte (artigo 216, parágrafo 1o) prevê que o Poder Público, cumprirá seu dever de proteção do patrimônio cultural brasileiro, por meio "de outras formas de acautelamento e preservação", além do tombamento, registros etc. O parecer da Diretora do DPH não destoa disso: "por fim, lembramos que a definição corrente de preservação engloba diversos tipos de ações, para além do tombamento. Beatriz Kühl afirma que 'a palavra preservação no Brasil possui um sentido lato que abarca variados tipos de ações, tais como inventários, registros, providências legais para a tutela, educação patrimonial e políticas públicas'". Ou seja, o caráter transitório do grafite, como arte de rua, não impede o seu reconhecimento como bem cultural, que, de fato, é, impondo, assim, alguma política cultural que o preserve ainda que por um determinado tempo, enquanto outra obra não o substitua. Aliás, como dimensionar a efemeridade desta manifestação artística, sobretudo na nossa sociedade líquida (Zygmunt Bauman) e da era digital, na qual tende a predominar a liquidez das coisas e das relações humanas? O Estado poderia fazer isso? Ou seria apenas o artista responsável pelo grafite? Certamente não é órgão competente pela ordenação da paisagem urbana, como quer o Município. Desta forma, não fosse o caráter de bem cultural do grafite, que merece preservação e fomento do Poder Público, razão teria o município de remover tais inscrições do espaço urbano público sem prévia manifestação e diretrizes do seu órgão técnico ligado à cultura, em virtude de "reorientação administrativa da paisagem de tais bens públicos de uso comum, seguida de simples execução da atribuição própria e ordinária de zeladoria urbana pela administração municipal". Ou seja, no caso, a nova orientação administrativa na organização do espaço urbano público consiste, basicamente, em substituir uma manifestação cultural e artística geralmente de jovens da periferia da cidade de São Paulo por tinta cinza, de gosto bastante duvidoso, e, depois, por jardim vertical. Espera-se, a sociedade paulistana (que, em pesquisa Datafolha publicada ontem, aprova, de forma esmagadora, o uso do grafite como forma de reapropriação do espaço urbano público), que esteja incluída neste novo rumo a melhoria das vias públicas onduladas e esburacadas, das muitas calçadas intransponíveis, e o emaranhado de fios e cabos das concessionárias de serviço público de energia e telefonia e das empresas particulares de tv a cabo e internet, entre outras, que despencam dos postes desta cidade. Nada obstante, pode-se dizer que tais ações, também, sob o ponto de vista da ordem urbanística (estética urbana), mostram-se contrárias, em essência, aos marcos regulatórios ético-jurídico-políticos da Constituição Federal (artigo 182 caput) e do Estatuto da Cidade, que são limites impositivos à ação política-administrativa do gestor ou administrador público. Ultrapassa-los, nulifica, juridicamente, e desqualifica, social e eticamente, sua conduta. O Estatuto da Cidade fixa, de forma clara, as diretrizes da política urbana dos Municípios para atingir os seus objetivos constitucionais (ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar dos habitantes), entre elas, merecendo destaque para o caso em questão: a gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano; e a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico. Portanto, a ação de ordenação da paisagem urbana, por imposição do Estatuto da Cidade, não pode ser decididadiscricionariamente, sponte propria, pelo administrador de plantão, e, também, deve ser orientada no sentido de proteger, preservar e recuperar o patrimônio cultural e artístico. O que se tem visto é justamente o contrário: ato discricionário e precipitado, no mínimo, desprezando a opinião do colegiado técnico do município ligado à cultura, no qual se encontra representada, democraticamente, a sociedade civil, e que ultrapassa, à primeira vista, os limites impositivos fixados pelos marcos regulatórios constitucionais da ordem cultural e urbanística. Na realidade, as políticas de desenvolvimento urbano e cultural, por imposição constitucional, são definidas pelo Estado em conjunto com a sociedade, portanto, como políticas de Estado, e não de governo, como parece crer aquele que age contra suas diretrizes. Aliás, a centralidade destas políticas na agenda governamental seria o ideal, ao invés das políticas econômicas recomendadas pelo Consenso de Washington, porém, os níveis orçamentários dos entes políticos demonstram o contrário.É de se pensar se tal ação, sob forte recalque janista, não seria preconceituosa e autoritária, excludente de expressões culturais que buscam justamente a inserção social e a integração de pessoas com realidades ou experiências tão diferentes, princípios ou valores estes que, necessariamente, deveriam nortear as políticas da cultura e do desenvolvimento urbano. Também é de se ponderar se, ao invés de excluir e marginalizar jovens de baixa renda pelo aumento da proibição, não seria melhor acolhê-los em programas de desenvolvimento de suas habilidades artísticas, afastando-os do crime organizado, sem contar que a arte é tida como uma forma de sublimação do fluxo ou moção pulsional, ou seja, toda a força da pulsão é desviada, ainda que satisfação parcial, de sua finalidade primária para se colocar então a serviço de uma finalidade social, seja ela artística, intelectual ou moral (J.-D. Nasio, Lições sobre os sete conceitos cruciais da Psicanálise, Editora Zahar, p. 81). Outrossim, o item 5.3 da Resolução do CPPU citada acima, a meu ver, para ser preservado no mundo jurídico, deve ser interpretado conforme as normas constitucionais regulatórias da ordem urbanística e do Estatuto da Cidade. Assim, a revisão da autorização ali prevista, como quer o município, não pode significar a possibilidade de remoção, pura e simplesmente, do grafite ou mural, sob pena de afrontar o dever constitucional do Estado de preservar e fomentar manifestação artística popular, enquanto patrimônio cultural brasileiro. Ou melhor, significaria, no máximo, sua substituição por novo grafite do mesmo ou de outro artista.Por tudo isso, presente o requisito da probabilidade do direito; o risco de dano evidencia-se pelo próprio teor da defesa do município, que persistirá, discricionariamente, na remoção dos grafites em espaços públicos da cidade, colocando em risco o seu patrimônio cultural. Ante o exposto e o que mais consta dos autos, visando proteger o patrimônio cultural composto pelos grafites, inscrições artísticas e murais espalhados pelos espaços urbanos públicos da cidade de São Paulo, concedo a tutela antecipada para que os réus se abstenham imediatamente de removê-los sem prévia manifestação e diretrizes do CONPRESP, ou mesmo do Conselho Municipal de Política Cultural, sob pena de multa diária de quinhentos mil Reais, além de outras sanções. Citem-se, servindo a presente como mandado. Ciência do MPE.Por fim, havendo identidade de pedido e de causa de pedir remota, portanto, conexão entre a presente ação e a que tramita perante a 16a Vara da Fazenda Pública da Capital, e estando este juízo prevento, por força do artigo 59 do CPC, já que esta ação foi distribuída no dia 31 de janeiro de 2017 e aquela no dia 02 de fevereiro deste ano, solicite-se, por ofício, a remessa e redistribuição do processo nº 1003969-51.2017, para evitar decisões conflitantes. Int. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP)

(14/02/2017) OFICIO JUNTADO

(15/02/2017) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0048/2017 Data da Disponibilização: 15/02/2017 Data da Publicação: 16/02/2017 Número do Diário: Página:

(15/02/2017) ATO ORDINATORIO - NAO PUBLICAVEL - Ato Ordinatório - Genérico - Com Atos e Não Publicável

(15/02/2017) MANDADO EXPEDIDO - Mandado nº: 053.2017/009181-4 Situação: Cumprido - Ato positivo em 01/03/2017 Local: Cartório da 12ª Vara de Fazenda Pública

(15/02/2017) MANDADO EXPEDIDO - Mandado nº: 053.2017/009186-5 Situação: Cumprido - Ato positivo em 24/02/2017 Local: Cartório da 12ª Vara de Fazenda Pública

(15/02/2017) CERTIDAO DE CARTORIO EXPEDIDA - Certidão - Genérica

(15/02/2017) ATO ORDINATORIO - NAO PUBLICAVEL - Vista ao Ministério Público.

(15/02/2017) CERTIDAO DE REMESSA DA INTIMACAO PARA O PORTAL ELETRONICO EXPEDIDA - Certidão - Remessa da Intimação para o Portal Eletrônico

(17/02/2017) MANDADO DEVOLVIDO CUMPRIDO POSITIVO - Certidão - Oficial de Justiça - Mandado Cumprido Positivo

(21/02/2017) MANDADO DEVOLVIDO CUMPRIDO POSITIVO - Certidão - Oficial de Justiça - Mandado Cumprido Positivo

(24/02/2017) MANDADO JUNTADO

(02/03/2017) MANDADO JUNTADO

(06/03/2017) OFICIO JUNTADO

(06/03/2017) CONCLUSOS PARA DECISAO

(06/03/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.Fls. 261/265: Ciente.No mais, aguarde-se a vinda da contestação.Intime-se.

(13/03/2017) CONTESTACAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70062509-3 Tipo da Petição: Contestação Data: 13/03/2017 14:49

(17/03/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0099/2017 Teor do ato: Vistos.Fls. 261/265: Ciente.No mais, aguarde-se a vinda da contestação.Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP)

(20/03/2017) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0099/2017 Data da Disponibilização: 20/03/2017 Data da Publicação: 21/03/2017 Número do Diário: Página:

(08/05/2017) CERTIDAO DE CARTORIO EXPEDIDA - Certidão - Genérica

(08/05/2017) CONCLUSOS PARA DECISAO

(08/05/2017) DECISAO PROFERIDA - VistosÀ réplica, nos termos dos artigos 350 e 351, ambos do NCPC, no prazo de quinze dias. Após, abra-se vistas ao Ministério Público.Intime-se.

(18/05/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0192/2017 Teor do ato: VistosÀ réplica, nos termos dos artigos 350 e 351, ambos do NCPC, no prazo de quinze dias. Após, abra-se vistas ao Ministério Público.Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP)

(19/05/2017) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0192/2017 Data da Disponibilização: 19/05/2017 Data da Publicação: 22/05/2017 Número do Diário: Página:

(12/06/2017) CERTIDAO DE CARTORIO EXPEDIDA - Certidão - Genérica

(12/06/2017) CONCLUSOS PARA DECISAO

(12/06/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.À réplica, nos termos dos artigos 350 e 351, ambos do NCPC, no prazo de quinze dias. Após, abra-se vistas ao Ministério Público.Int.

(20/06/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0240/2017 Teor do ato: Vistos.À réplica, nos termos dos artigos 350 e 351, ambos do NCPC, no prazo de quinze dias. Após, abra-se vistas ao Ministério Público.Int. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP)

(22/06/2017) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0240/2017 Data da Disponibilização: 22/06/2017 Data da Publicação: 23/06/2017 Número do Diário: Página:

(23/06/2017) REPLICA JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70181368-3 Tipo da Petição: Manifestação Sobre a Contestação Data: 23/06/2017 15:34

(07/07/2017) CONCLUSOS PARA DECISAO

(07/07/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.A despeito da revelia do corréu, ela não produz efeito, nos termos do artigo 345, I, do NCPC.Especifiquem as provas, justificando-as, sob pena de indeferimento. Após, ao MPE, para se manifestar sobre a defesa e especificar provas.Intime-se.

(13/07/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0267/2017 Teor do ato: Vistos.A despeito da revelia do corréu, ela não produz efeito, nos termos do artigo 345, I, do NCPC.Especifiquem as provas, justificando-as, sob pena de indeferimento. Após, ao MPE, para se manifestar sobre a defesa e especificar provas.Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP)

(14/07/2017) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0267/2017 Data da Disponibilização: 14/07/2017 Data da Publicação: 17/07/2017 Número do Diário: Página:

(20/07/2017) ESPECIFICACAO DE PROVAS JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70213056-3 Tipo da Petição: Indicação de Provas Data: 20/07/2017 11:03

(24/07/2017) ESPECIFICACAO DE PROVAS JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70217710-1 Tipo da Petição: Indicação de Provas Data: 24/07/2017 19:33

(13/09/2017) CONCLUSOS PARA SENTENCA

(13/09/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.Por ora, ao MPE, como determinado na decisão retro, parte final.Intime-se.

(18/09/2017) ATO ORDINATORIO - NAO PUBLICAVEL - Vista ao Ministério Público.

(18/09/2017) CERTIDAO DE REMESSA DA INTIMACAO PARA O PORTAL ELETRONICO EXPEDIDA - Certidão - Remessa da Intimação para o Portal Eletrônico

(02/10/2017) REMETIDO AO DJE - Relação: 0383/2017 Teor do ato: Vistos.Por ora, ao MPE, como determinado na decisão retro, parte final.Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP)

(03/10/2017) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0383/2017 Data da Disponibilização: 03/10/2017 Data da Publicação: 04/10/2017 Número do Diário: Página:

(05/10/2017) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70305415-1 Tipo da Petição: Petição Intermediária Data: 05/10/2017 12:33

(17/11/2017) PETICAO JUNTADA - Nº Protocolo: WFPA.17.70355351-4 Tipo da Petição: Petições Diversas Data: 17/11/2017 11:44

(01/12/2017) AGRAVO DE INSTRUMENTO - ACORDAO E DEMAIS PECAS JUNTADOS - COM TRANSITO EM JULGADO - AGRAVO DESTRUIDO

(01/12/2017) CONCLUSOS PARA SENTENCA

(01/12/2017) DECISAO PROFERIDA - Vistos.Por ora, diante do alegado prejuízo ao patrimônio público, constante dos autos do processo nº 1003969.51.2017, no prazo de trinta dias, deverá o Município comprovar o custo do painel que foi apagado na Avenida 23 de Maio, sob as penas da lei. Intime-se.

(24/01/2018) REMETIDO AO DJE - Relação: 0011/2018 Teor do ato: Vistos.Por ora, diante do alegado prejuízo ao patrimônio público, constante dos autos do processo nº 1003969.51.2017, no prazo de trinta dias, deverá o Município comprovar o custo do painel que foi apagado na Avenida 23 de Maio, sob as penas da lei. Intime-se. Advogados(s): Paulo de Abreu Leme Filho (OAB 151810/SP), Priscila Sanda Nagao Cardoso (OAB 182612/SP), Sergio Barbosa Junior (OAB 202025/SP), José Roberto Strang Xavier Filho (OAB 291264/SP)

(29/01/2018) CERTIDAO DE PUBLICACAO EXPEDIDA - Relação :0011/2018 Data da Disponibilização: 29/01/2018 Data da Publicação: 30/01/2018 Número do Diário: Página: